Com o slogan “Não disfarce a sua dor”, a Câmara Municipal de Belo Horizonte lançou em agosto de 2022 uma campanha institucional de combate à violência contra a mulher, com o propósito de orientar as vítimas de violência doméstica a denunciarem os maus-tratos, além de indicar que compareçam aos órgãos de acolhimento e atendimento para esse tipo de situação. A campanha foi desenvolvida pela agência mineira Fazenda Comunicação & Marketing, poucos dias depois da divulgação do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, de 2021, que apontou que Minas Gerais é o estado com mais registros de feminicídio, seguido por São Paulo e Rio Grande do Sul.
Os dados do levantamento da Polícia Civil de Minas Gerais mostram ainda que em 2019 foram 150.972 vítimas de violência doméstica e familiar contra a mulher. Foram 75.256 no primeiro semestre e 75.716, no segundo. Em 2020, os números são 69.967, no primeiro semestre e 75.304, no segundo, totalizando 145.271. E em 2021, apenas do primeiro semestre, foram registradas 70.450 mulheres vítimas de violência em Minas Gerais.
Mais de um caso por dia de violência contra a mulher em Itaúna
Em Itaúna, a delegada de mulheres, Luciene Flávia Junqueira Caldas, enfatiza que a violência contra a mulher é ampla e não se encerra em casos de estupros e feminicídio. Acerca da campanha da Câmara Municipal de Belo Horizonte, ela confessa que não tem muitas informações, mas destaca sua importância para auxiliar os órgãos que cuidam da segurança pública e dar voz às vítimas ante qualquer tipo de violência. Segundo a delegada Luciene Caldas, numa média dos últimos seis meses de atendimento de medidas protetivas e de violência doméstica familiar, são registradas 25 a 30 situações por mês. “Isso quer dizer no âmbito da família, ou seja, maridos, ex-maridos, namorados, ex-namorados. É uma média, porque tem mês que o número cai, em 23, 24, noutro aumenta para mais de 30. A média então é essa. Agora, com relação a estupros, abusos, importunação sexual, que ocorrem nas ruas, ainda não temos esse levantamento”, pontuou.
Combate à violência com ações no Legislativo de Itaúna
A vereadora Edênia Alcântara (PDT), presidente da Comissão dos Direitos da Mulher na Câmara Municipal e vice-presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher, afirma que uma de suas demandas hoje é o combate à violência contra a mulher em todas as situações. Ela destaca que quando uma mulher sofre violência, toda família também sofre, principalmente os filhos.
“A primeira ação minha como vereadora foi criar a Comissão dos Direitos da Mulher da Câmara Municipal, pois em um município com 120 anos de história nunca tivemos uma comissão que tratasse com prioridade a defesa dos direitos das mulheres. Durante esses dois anos de mandato, apresentei dois projetos super importantes para o fortalecimento de políticas públicas voltadas para as mulheres. Um foi a criação do “Selo Empresa Amiga da Mulher“, com o propósito de estimular as pessoas jurídicas a contribuírem para realização de ações e projetos de defesa dos direitos de suas colaboradoras. O outro foi o projeto que institui a política de atendimento à mulher vítima de violência no município de Itaúna”, ressalta.
Apoio dos órgãos e fortalecimento das políticas públicas
A vereadora diz que vem dialogando com o executivo para implementação das leis nos órgãos que fazem parte da rede de apoio, como a Secretaria de Desenvolvimento Social, CRAS, CREAS, Delegacia de Polícia Civil, Hospital Manoel Gonçalves, Polícia Militar e Conselho Municipal dos Direitos da Mulher.
“Ainda existem falhas e é preciso que haja vontade política maior para conseguir de fato proteger amplamente mulheres e meninas vítimas de violência. E para isso é necessário levar a sério a necessidade do fortalecimento do Conselho da Mulher da cidade. Estou como vice-presidente, e através da nossa insistência conseguimos elaborar o regimento e o estatuto do Conselho. Estamos aguardando agora uma resposta da atual presidente sobre a efetivação do fundo. Para esse fundo tenho interesse de destinar emendas impositivas e buscar verbas em níveis estadual e federal. Essa proposta é para que consigamos de fato buscar meios de abrigar mulheres e seus filhos que precisam se ausentar do lar por causa da violência doméstica”, explicou.
Rede de apoio visível e real a todas as mulheres
Edênia Alcântara protocolou esse mês um projeto de lei que torna obrigatório aos estabelecimentos do município a adoção de medidas para auxiliarem mulheres que se sintam em situação de risco em suas dependências. “A lei prevê que bares, restaurantes e casas noturnas deem suporte a elas para chegarem a um transporte com segurança e façam contato com a polícia, caso seja solicitado. É necessário que toda a sociedade civil e o executivo realmente abracem a causa da defesa dos direitos das nossas mulheres e crianças. Quando falo na proteção de direitos, também falo na garantia de mais creches com horários que realmente atendam as mães que trabalham em horário comercial, falo de uma rede de apoio visível e real, falo na garantia do acesso gratuito à absorventes para meninas e mulheres carentes. É necessário ter uma casa para abrigo, um sistema de atendimento médico priorizando as mulheres e exames de rotina, entre outras inúmeras demandas que garantam que as mulheres de Itaúna tenham real garantia dos seus direitos. Quando uma mulher tem dificuldade ou não consegue acessar os serviços oferecidos pelo município, essa mulher também está sofrendo violência por parte do executivo ou legislativo. E meu dever é garantir que essas violências não ocorram”, enfatiza.
Denúncia por telefone
Nos casos de mulheres vítimas de violência em Itaúna é necessário denunciar através dos telefones 190 ou 180. “Como presidente da comissão de Direitos da Mulher e Direitos Humanos me coloco à disposição para acompanhar toda e qualquer tipo de denúncia envolvendo violação de direitos de todas meninas, mulheres, mulheres trans de Itaúna”, afirmou.
Lohanna França destaca os pontos de acolhimento nos municípios, mas cobra mais divulgação
A vereadora Lohanna França (PV), que tomará posse na Assembleia Legislativa no próximo dia 1º, pontuou a questão dos pontos de acolhimento para mulheres vítimas de violência doméstica. Ela citou Itaúna e Divinópolis, mas salientou a baixa procura em razão da pequena divulgação dos serviços. Lohanna cobrou que os legislativos deem mais amplitude a essas ações para que as vítimas não fiquem ainda mais desassistidas, principalmente para aquelas que estão em situação de vulnerabilidade e às que não têm tanto acesso aos espaços públicos. “Assim, elas poderão tomar conhecimento de que as câmaras municipais oferecem esse tipo de serviço, apoio jurídico etc. Também em Divinópolis, a gente sabe que a procura não é como a gente queria, pois entendemos que os casos de violência são muitos”, afirma.
Patrulhas policiais com mulheres no atendimento às vítimas
Sobre sua atuação como deputada estadual a partir do próximo mês, Lohanna revela que irá buscar fortalecimento da atuação da polícia, especialmente das patrulhas de proteção à mulher, formadas em sua maioria por homens. Ela ressalta que atualmente existem poucas viaturas para toda a 7ª região da PM e que o aumento desses equipamentos é de grande importância para o trabalho da PM.
“É uma situação que precisa ser resolvida para garantir que essas viaturas tenham policiais femininos trabalhando, porque é importante uma mulher atender outra. Em uma situação de violência, isso faz toda a diferença. Outra questão é com relação à legislação federal para que a ‘Lei Maria da Penha’ passe por algumas regulamentações que ainda não foram feitas. Algumas questões dessa lei não são cumpridas na prática, como da violência psicológica, do ‘crime de stalking’, que se caracteriza pela perseguição e intimidação do agressor à sua vítima em locais onde esta frequenta. É necessário um treinamento das forças de segurança para que essas novidades na lei se tornem prática. Então, é necessário um trabalho em nível federal, de mudança da legislação, de divulgação dos serviços em nível municipal, como dos pontos de acolhimento e cobrança em todos os setores para que as implementações aconteçam de forma correta”, opina.
Ações do governo Lula
A deputada eleita lembra que na Polícia Rodoviária, o governo anterior retirou dos cursos de formação, as aulas de direitos humanos, onde se evidenciavam a Lei Maria da Penha e outras medidas de proteção às mulheres. “Acredito que o governo Lula irá corrigir esse erro do governo anterior e garantir que as nossas polícias em todas as esferas e entes federativos sejam bem capacitadas para atender as mulheres vítimas de violência”, observou.
Hospital de Itaúna mantem serviço de atendimento a mulheres vítimas de violência
Recentemente a Casa de Caridade Manoel Gonçalves de Souza Moreira atendeu uma menina de nove anos que teria sido vítima de estupro. O atendimento, na verdade, foi apenas uma verificação inicial da situação, pois a mesma foi encaminhada para uma unidade de saúde em Divinópolis. A transferência se deu, segundo informações da direção do hospital em Itaúna, pelo fato de não haver atendimento pediátrico no Pronto Socorro local em virtude da idade da paciente. Somente pré-adolescentes, a partir de 12, são atendidas pelo setor de obstetrícia, razão pela qual a criança não foi assistida no Hospital.
Na ocasião, a Polícia Civil emitiu uma nota sobre o ocorrido esclarecendo que o protocolo de atendimento às vítimas de violência sexual em Itaúna, em relação às mulheres adultas, está sendo cumprido e funcionando corretamente. No caso da menina, menor de nove anos, ela foi encaminhada para Divinópolis porque não havia, no momento da ocorrência, médico pediatra no Hospital Manoel Gonçalves.
“As mulheres estão protegidas em Itaúna”
Na tarde de ontem, a delegada Luciene Junqueira Caldas fez contato com o Jornal S´Passo afirmando que já dispunha das estatísticas de crimes sexuais contra a mulher na cidade. É uma média de oito ocorrências por mês, envolvendo crianças, adolescentes ou adultas em crimes de estupro, abuso, assédio e importunação sexual. “Eu acho que não é alta essa estatística, que os números estão bem controlados, muito em razão da solicitação e atendimento pela justiça de medidas protetivas para as mulheres. Sinto que as mulheres estão protegidas aqui. Existe uma parceria com a justiça que tem concedido medidas protetivas que os homens precisam acatar e isso freia a violência doméstica e familiar. As medidas protetivas têm sido muito eficazes em Itaúna”, ressaltou.