QUE HISTÓRIA É ESSA? O galo e o relógio despertador

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Sílvio Bernardes
smabernardes@hotmail.com

Quem se lembra do infalível relógio despertador, que ficava no criado mudo ou na cabeceira da cama? Recordo-me de um, da marca Westclock, e que durou por muito tempo, servindo a um colosso de gente lá em casa. A gente dava corda nele numa chavinha que ficava nas suas costas. Ao lado dessa chavinha ficava  outra que era a do despertador. A gente tinha que destravá-la senão o despertador não era acionado. Meu Deus, quantas vezes a gente se enganava, não destravava o raio da chavinha e a porcaria não despertava. Merda! Quando isto acontecia, muita gente perdia a hora. E perder a hora é um transtorno. A gente acorda de mau humor, tem que se arrumar correndo, não dá tempo de tomar café, nem pentear o cabelo, se esquece de abotoar a braguilha, não escova os dentes direitinho e deixa de tirar a remela do olho.

Acho que pouca gente gostava de despertador, mas quanta serventia ele tinha para toda a família. O pai levantava da cama cedo para ir pro trabalho por causa dele. Era ele quem acordava a mãe, que chamava a filharada para a escola e para o batente. O seu trimmmmmmmmmmmmm era a senha de um novo dia. Muitas vezes ele se antecipava ao sol – não somente nos dias em que amanhecia chovendo. “Acorda gente! Vamo levantá. O sol evém aí, passarinho não deve nada a ninguém e já tá cantando bonito e feliz”, era a fala da mãe imitando o homem da Rádio Clube de Itaúna, um tal de ‘Naningo Neto’.

O nosso despertador Westclock era um companheiro do dia a dia. A sua sineta fazia um barulhão que podia acordar todo um quarteirão.  No escuro ele brilhava por causa do seu mostrador que tinha pontinhos luminosos sob os números. O seu tique-taque constante – sob o comando da corda – era também ruidoso. E, dentro da casa era ele quem nos dava a hora certa, quando rádio não estava funcionando. E se estragava a sua engenhoca, tinha que ir correndo ao relojoeiro, por que como diz o outro homem do rádio: “relógio que atrasa não adianta”. E o povo da casa tinha que levantar cedo, sem despertador não dá.

 E de primeiro também havia nas horas mais claras das manhãs um despertador diferente – muito diferente do relógio de cabeceira e dos aparelhos celulares de hoje –, o galo. Chamado de dono do pedaço, rei do terreiro, o galo acordava com um cocoricó para chamar suas franguinhas e dizer aos humanos que estava na hora de se levantar e ir à luta. Creio que os galos de antigamente não obedeciam muito a hora não. Conheci alguns que cantavam pela manhã, mas outros se esgoelavam de madrugada, às escuras, e até, à noite. Para esses, havia sempre alguém furibundo que prometia “botar esse bicho na panela e acabar com essa barulheira”.

Os galos não cantam mais (como os grilos, do Fernando Sabino). Eles se foram pelo mesmo caminho que os relógios despertadores. E por causa disso muita gente tem perdido a hora.