Desvio de funções e uso de imagem de comerciários em propagandas de lojas podem trazer problemas para empresários

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O período pandêmico da Covid-19 acelerou diversos processos no campo digital, incluindo o da publicidade. Com o isolamento social e o fechamento de muitos setores comerciais, empresários de diferentes segmentos tiveram que se reinventar. A internet e suas plataformas surgiram como uma maneira de alcançar o consumidor final, especialmente no setor de delivery, que também se aqueceu nesse período.

Plataformas como Instagram e TikTok se tornaram as favoritas do marketing digital, superando até mesmo o Facebook. Arte, postagens e vídeos mostrando produtos, além das famosas dancinhas, explodiram, impulsionando as vendas de marcas. Alguns empreendedores gostaram tanto dessa nova forma de faturar que decidiram encerrar suas atividades físicas e migrar completamente para o digital, economizando em logística e mão de obra.

No entanto, um detalhe parece ter passado despercebido ou ser desconhecido por milhares de pequenos e médios empresários que colocam seus funcionários para gravar vídeos e tirar fotos como “modelos” apresentando os produtos a serem comercializados no ambiente digital: o direito de imagem. Antes, empresas e profissionais qualificados eram contratados para desenvolver conteúdo comercial em áudio, vídeo e imagem, incluindo atores e modelos profissionais. Hoje, comerciantes estão utilizando seus próprios funcionários das lojas, que foram contratados para realizar vendas físicas, para gravar peças comerciais digitais, lançadas na internet para divulgar seus produtos e impulsionar as vendas.

Essa prática também pode ser considerada um “desvio de função”, quando os funcionários executam atividades diferentes daquelas para as quais foram contratados, o que pode acarretar consequências no âmbito trabalhista.

A mocinha do supermercado diz à reportagem que foi contratada como operadora de caixa, porém, nos finais de semana, a loja exige que ela e os demais funcionários realizem outras tarefas, como lavar banheiros, ajuntar o lixo e levá-lo ao depósito, fazer reposição de mercadorias nas prateleiras, entre outras funções estranhas ao seu contrato de trabalho.

Outros comerciários que trabalham como balconistas também podem estar sendo aproveitados como garotos e garotas propaganda dos produtos ali comercializados em panfletos, vídeos e operações de áudio nas próprias lojas.

As situações são reais em estabelecimentos comerciais de Itaúna, embora nenhum dos personagens quis ter seu nome revelado a fim de não sofrerem represálias. Muitos desses são jovens estão no primeiro emprego. O desvio de função em lojas da cidade ganhou novos contornos com as informações de que comerciantes estão utilizando empregados para venderem seus produtos através de posts em áudio e vídeo compartilhados nas redes sociais. Três casos que estão divulgados no ambiente digital foram enviados para a reportagem do Jornal S´Passo. “É preciso que alguém faça alguma coisa. Não podemos dizer não, porque senão perdemos nosso emprego. Mas também não podemos deixar de falar o que está acontecendo”.

O Jornal S’PASSO conversou com o advogado trabalhista Rafael Lisboa, que esclareceu que o uso da imagem do funcionário não pode ser presumido pelo contrato de trabalho. “O direito à imagem é independente e para que a empresa faça uso dela em peças publicitárias precisa ter uma autorização expressa do empregado, preferencialmente por escrito. A Justiça do Trabalho tem condenado em indenização por danos morais empresas que fazem postagens em redes sociais sem autorização expressa e sem comprovação de alguma contrapartida financeira”.

Segundo o profissional, é até possível que o empregado conceda a autorização de uso da imagem sem pagamento algum, mas para resguardar ambas as partes é recomendável a fixação de algum valor e que o uso da imagem seja razoável. O uso excessivo com ganhos apenas para a empresa, mesmo com autorização expressa, mas gratuita, pode ser entendido como desequilíbrio contratual e também ensejar indenização. Aqui, como em qualquer matéria na seara jurídica, as partes devem agir com razoabilidade e boa-fé”, explicou.