QUE SAUDADE DA PROFESSORINHA

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Os professores e a missão de incentivar a leitura

@toniramosgoncalves*

Ler é um hábito que, além de ser agradável, oferece muitas oportunidades, tanto para adquirir conhecimento sobre o mundo quanto para trocar ideias. No entanto, para que a leitura se torne uma rotina e um comportamento constante, é necessário desenvolver estratégias que tornem essa habilidade viável, já que a leitura literária ainda não é uma prática frequente na cultura brasileira.

De modo geral, é na escola que as pessoas aprendem a ler e escrever desde cedo, embora em alguns casos esse processo ocorra em casa. No entanto, é nela que a criança começa a participar da vida comunitária e, dentro desse ambiente, que inclui alfabetização e letramento, a escola se consolida como a instituição que molda o hábito da leitura.

Recordo que, durante minha adolescência no ensino fundamental e médio, os professores, especialmente os de língua portuguesa, incentivavam muito a leitura como uma forma de lazer, e não era tão voltada para o ENEM como é hoje em dia. Para os vestibulares, os estudantes precisavam ler as obras indicadas na íntegra.

De acordo com Caio Riter (2009), é papel dos professores despertar o interesse pela leitura. Para isso, eles precisam ser entusiastas dela, leitores competentes que saibam escolher e recomendar livros e que estejam atualizados com o mercado editorial. Infelizmente, ainda há professores que não têm o hábito de ler, e isso afeta significativamente a forma como os alunos percebem a leitura. Em pesquisa conhecida como Retratos da Leitura no Brasil, realizada pelo Ibope e Instituto Pró-Leitor, em 2015, com 1.680 professores entrevistados, revelou-se que 6% declararam que não gostam de ler, 31% que gostam só um pouco, 16% foram considerados não leitores, já que não leram uma parte de um livro nos últimos três meses, e outros 3% não tinham sequer um livro em casa.

Atualmente, nas escolas, o número de crianças que, mesmo após dois ou mais anos, ainda não sabem ler tem aumentado. Além disso, há problemas de interpretação e um alto índice de analfabetismo funcional nas faculdades. Isso ocorre devido à falta de estímulo à leitura, já que a televisão, o computador, o tablet e o smartphone ocupam mais tempo nas atividades das crianças do que os livros.

Há também a questão de a literatura nas escolas ser frequentemente ensinada através de fragmentos literários, recortes selecionados por editoras de livros didáticos, relegando o livro completo – a própria essência da literatura – a segundo plano. Dessa forma, os fragmentos usados em sala de aula por meio desses livros didáticos acabam substituindo a presença integral da literatura, o que significa que o autor, a obra, a sociedade e os mundos representados são deixados de lado.

Outro, porém, é a ligação tradicional entre o ensino da língua portuguesa e, de maneira mais específica, o ensino da gramática normativa nas escolas, que está fortemente associado aos textos literários. Reconhecemos que essa parceria frequentemente falha quando trechos de literatura são usados apenas para ilustrar a forma “correta” da gramática.

O livro didático pode ser uma ferramenta muito útil, mas também pode ser ineficaz, chegando a gerar resultados contrários aos desejados e gerando discussões e debates sobre a função da arte escrita. Segundo Cristóvão Tezza, autor do livro “O filho Eterno” (2007), no posfácio de “Ensaio da paixão” (1986), diz que a literatura, enquanto atividade adulta, não deve ser vista como material didático. Sua força reside justamente na direção oposta: a literatura expressa uma voz individual, única e intransferível, e é exatamente isso que a torna interessante. Por natureza, é uma atividade individualista, realizada sobre a matéria bruta e social da linguagem. Usando uma metáfora com um certo exagero, a literatura é uma experiência pessoal que não tem como objetivo ensinar o que o autor sabe, mas sim permitir que ele descubra, através da escrita, o que ainda não sabe, podendo eventualmente compartilhar essa descoberta com o leitor.

A discussão sobre a função da literatura é ampla. Alguns acreditam que ela aprimora a visão e a compreensão das pessoas sobre o mundo. Outros, no entanto, argumentam que essa arte não humaniza ninguém nem melhora a moral, mas, no máximo, pode ampliar os horizontes mentais e fortalecer a inteligência.

Embora a leitura na escola seja um grande avanço, para realmente aumentar o número de leitores no país, é necessário compartilhar essa responsabilidade. Ela não deve estar apenas nas instituições educacionais, mas também deve ser cultivada nas academias de letras, nas bibliotecas, no trabalho e, principalmente, dentro das famílias.

Independentemente da abordagem filosófica ou teórica sobre o tema, a literatura deve estar presente nas escolas e pode ser mais eficazmente integrada às salas de aula através de seus professores, fomentando assim a leitura. Para isso, é necessário superar as técnicas tradicionais de ensino que têm contribuído para o fracasso da leitura literária. Devemos adotar práticas que a valorizem, evitando o uso dela apenas para ensinar gramática normativa. Compreendendo essas diferenças, poderemos implementar ações que promovam uma sociedade que aprecia a arte como arte e a educação como educação.

Como dizia Monteiro Lobato: “Quem não lê, mal fala, mal ouve e mal vê.

* Toni Ramos Gonçalves (Não é o Global)

Professor de História, Escritor, Editor, ex-presidente e um dos fundadores da Academia Itaunense de Letras – AILE.