Geraldino de Souza Filho é conhecido como Mirinho. Ex-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Itaúna e ex-vereador do Partido dos Trabalhadores – PT, é casado com a professora Maria Cerila e pai do Leon Tito e Anaíde. Mirinho é itaunense e tem 62 anos.
- A sua trajetória é marcada por atuação política, sindical e até religiosa, na Igreja Católica. Conte um pouco sobre essa tripla militância e como foi que você se viu candidato e dirigente de um importante sindicato em Itaúna?
Iniciei minha participação em movimentos sociais em 1982 no Grupo de Jovens “NÓS”, na Vila Nazaré, inclusive ajudei nas campanhas de arrecadação para a construção da “Casa de Nazaré”. Depois atuei como secretário da Associação da Vila Nazaré e participei da Associação do Bairro Piedade, fui presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de 1986 a 1999, Presidente do PT de Itaúna e vereador de 2001 a 2004. Atualmente, sou advogado e continuo atuando nos movimentos sociais. Suspendi temporariamente a minha inscrição na OAB e “estou pegando uns bicos” como autônomo.
Comecei a militância num momento de intensa movimentação política no Brasil, já no final da ditadura, que começou em 1964. Como membro do grupo de jovens, participei de atividades organizadas por um movimento chamado “Missões” e daí fui convidado pelo jovem à época e hoje o glorioso Dr. Unaí Tupinambás a participar do PT onde atuei junto com o nosso querido João Bicudo e com apoio do Dr. Peri e família, Maria Ângela, Bené e muitos outros. Conseguimos montar a chapa de oposição e fomos vitoriosos na eleição do Sindicato dos Metalúrgicos.
- Junto com o Sindicato dos Metalúrgicos você trouxe para Itaúna a CUT e uma atuação mais à esquerda nos embates políticos até mesmo dentro do PT. Conte um pouco sobre isso.
A CUT-Centra Única dos Trabalhadores foi a grande impulsionadora e motivadora no combate ao peleguismo sindical da época e em Itaúna tivemos o apoio dessa entidade.
Na atuação política partidária eu participava de uma corrente dentro do PT considerada radical, chamada Convergência Socialista a qual deu origem ao PSTU e eu fui junto. Dentro do PT tivemos muito debates fraternos. Embora participasse de atividades partidárias, e, mesmo no PSTU, eu priorizava à época a luta sindical. Com a minha saída da diretoria do Sindicato dos Metalúrgicos, me filiei novamente ao PT sendo eleito vereador em 2000.
Penso que foi muito importante para Itaúna a nossa atuação política sindical na qual tivemos vitórias importantes enfrentando vários empresários que se julgavam donos de seus empregados. Além das vitórias sindicais eu participava de conselhos tripartite na cidade (Conselho Municipal de Saúde, Conselho Municipal de Emprego) e assim conseguimos influenciar politicamente e economicamente os destinos da cidade. Estivemos na luta contra o desemprego, quando criamos duas Cooperativas, sendo uma para que os trabalhadores da então falida Cia Industrial Itaunense assumissem a empresa e a outra para gerar trabalho e renda. Não conseguimos convencer os trabalhadores a assumirem a empresa, inclusive os técnicos não acreditavam, porém demos abertura para o surgimento da COOPETEX e, embora não participássemos diretamente dela, demos o nosso apoio mesmo que discreto.
A outra é a COOPERT. Esta foi debatida em um encontro de trabalhadores itaunenses desempregados no qual contamos com apoio financeiro de algumas entidades, com o apoio burocrático da saudosa Elza Lopes e do apoio fundamental da administração pública da época comandada pelo prefeito Osmando. Logo depois do encontro, criamos a COOPERT-Cooperativa de Reciclagem e Trabalho que hoje gera diretamente quase 100 postos de trabalho e renda e outros indiretamente, inclusive é uma das vitrines de Itaúna no exterior , assim como o é a APAC (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados).
- Itaúna sempre foi uma cidade mais conservadora nos aspectos políticos e sociais. Como foi e como é atuar em partidos de esquerda num cenário como esse? Quais são, na sua opinião, os principais desafios enfrentados pelas correntes progressistas?
Éramos considerados radicais e éramos inclusive muito perseguidos. Como exemplo posso citar o fato de uma empresa que estava sendo cogitada para se instalar em Itaúna dizer que não veio por nossa causa. Publicamente, na Câmara Municipal, um vereador se referiu a mim como “o câncer de Itaúna”. Nós demos resposta à altura e, ao longo do tempo, com o aparecimento de muitas mulheres que trabalhavam nessa empresa, que se instalou em cidade vizinha, com inúmeros problemas de saúde, ficou claro para a população que a nossa atuação sindical rígida estava correta.
Penso que os principais desafios hoje, além do financeiro, são a individualização da pessoa colocada numa bolha pelas narrativas predominantes inclusive em redes sociais e a cooptação de novas lideranças por parte de quem assume o poder executivo. Também a falta de oportunidades e de provocação de debates políticos que envolvam de forma individualmente ou coletivamente as pessoas interessadas. Vale lembrar a indiferença e a falta de atuação política e de apoio aos movimentos sociais, por parte de alguns sindicatos e de políticos que se elegem mas não fazem a diferença, pois mantém a mesma política “feijão com arroz” e são indiferentes à quebra de paradigmas.
- Recentemente Itaúna viu nascer o Movimento Conservadores Cristãos e empreender de forma mais clara a movimentação da direita. Como você vê essa situação e em que medida ela se efetiva no cenário político itaunense?
Penso que é um movimento político ideológico financiado por empresários e pessoas ligadas à elite itaunense que não admite dividir, assim como luta contra a qualquer divisão da riqueza que é produzida com a população ou a exploração de recursos naturais.
- A eleição do presidente Bolsonaro e sua enorme votação em Itaúna vem confirmar a tendência política de nossa cidade ou o bolsonarismo se projetou somente nas eleições de 2018? É possível vislumbrar um novo cenário para os próximos anos? O que o PT, o PSOL e demais forças progressistas podem fazer para mudar a situação?
Penso que o “Bolsonarismo” em Itaúna surgiu junto com o que ocorreu no país inteiro. Os grupos econômicos, a grande imprensa e os influentes políticos anti-petistas, inclusive líderes religiosos, com suas narrativas ideológicas conseguiram endemonizar a política de um modo geral, conseguiram colar a imagem do PT à corrupção e daí convenceram os eleitores, então já desiludidos e frustados, que “o mito vai sê bão prá nóis”.
Não nego que o desafio para mudar essa realidade é grande, principalmente por causa da falta de recursos financeiros e das bolhas ideológicas criadas pelas narrativas e pautas conservadores pregadas por líderes empresariais, líderes políticos e líderes religiosos. Só que essa onda de fortalecimento da direita em Itaúna e essa narrativa conservadora estão sendo testadas e não trarão nenhum fruto positivo para os pobres, para os trabalhadores e nem trarão nenhum avanço de oportunidades para os negros, nem para os demais grupos discriminados pela elite branca e pelo “cidadão de bem”. Pelo contrário, inclusive penso que algumas personalidades dessa elite atrasada, se tiverem oportunidade, poderão até querer “colocar uma bola de ferro e uma corrente na nossa canela”, pois continuam pensando como os senhores de engenho. Assim, nós continuaremos combatendo essa política do atraso e da exclusão social e temos certeza de que a experiência concreta com essa política pregada pelos conservadores será desmascarada, não só pelo PT ou PSOL, mas pelos movimentos sociais.
- Falando em presidente Bolsonaro, o que esperar para as eleições 2022? Na sua opinião, o Brasil irá conseguir traçar novos caminhos políticos e recuperar os avanços econômicos e as conquistas sociais de um passado recente, anterior à pandemia da Covid-19?
Penso que em uma conjuntura de normalidade política e sendo mantidas as regras eleitorais atuais, se não conseguirem novamente impedir o LULA de ser candidato, ele será eleito e terá oportunidade de mudar essa realidade. Assim, irá combater, com respeito às diferenças ideológicas, essa narrativa política do ódio predominante na atualidade. Assim, o Brasil conseguirá traçar novos caminhos políticos e recuperar os avanços econômicos e as conquistas sociais. Se vingar a eleição de alguém da “terceira via”, os movimentos sociais terão novos desafios a serem enfrentados ou farão adaptação aos já enfrentados.
- No próximo dia 16 Itaúna completa 120 anos de emancipação político-administrativa. O que falar dessa efeméride? Quais são as perspectivas para o futuro dessa cidade?
Penso que Itaúna completa 120 anos com muitas conquistas em termos de crescimento econômico, porém a distribuição de renda está aquém do crescimento do município. A concentração de renda em Itaúna continua muito significante, assim como as oportunidades não são iguais.