Larissa Alves Santos
Sabemos que o sujeito é o inconsciente e mesmo que Freud tenha descoberto e nomeado é Lacan quem confirma que esse inconsciente é o sujeito, e sendo assim ele é atemporal. Atemporal porque não segue uma linha cronológica e sim tempos lógicos, buscando refletir que não se pode pensar o desenvolvimento infantil a partir da idade da criança. É importante identificar o tempo em que o sujeito está falando, esses que serão apresentados posteriormente como as fases do desenvolvimento. De acordo com Couto (2017), Freud, Klein e Lacan consideram a criança como um sujeito e não mais somente um objeto de intervenção.
Pensar a criança a partir do tempo lógico afasta o lugar de tentativa de “domar “ ou “adestrar” conforme o desejo do outro, pois quando falamos desse tempo estamos também afirmando a ideia de que o sujeito tem a sua individualidade e não há nenhum tutorial de procedimento como guia a ser seguido capaz, de fazer com que a criança tenha que passar por caminhos que se acredita que ela deve percorrer. Se reduzirmos as idades sustenta-se a garantia de que necessariamente ela precisa conquistar o que é esperado para aquele tempo, caso contrário ela terá algum diagnóstico sem ao menos ser escutada e sem escutar a história daquela família e sobre o desenvolvimento do sujeito. Assim não há possibilidade de padronizar a infância, precisa-se entender o sujeito a partir de sua individualidade.
A criança não verbaliza como um adulto, mas ela fala de alguma forma mesmo sendo crianças não-verbais e talvez seja uma escolha antiética, não escutá-las. Exemplo claro é quando percebemos alguns profissionais que hoje com a modernidade atendem, de maneira online, a criança a partir da queixa das (os) responsáveis e é medicalizada de modo a acreditar que para o sofrimento existe remédio. Volto a afirmar, sem ao menos escutar a história do próprio sujeito, mas de alguém que está contando sobre o outro. De modo particular, não é confortável para ninguém estar na posição de que o outro tem um saber sobre você.
Para a clínica com crianças, lidamos com alguns lugares delicados mediante a condução do tratamento. Diferente da condução com adultos que chegam à clínica e relatam sobre o seu lugar infantil e sobre o que é trazido de suas (es) cuidadoras (es), as crianças são levadas pelas pessoas que ocupam essas as funções materna e paterna. Ou seja, há uma fala das crianças sobre os responsáveis, uma fala dos responsáveis sobre si e sobre a criança. É importante perceber onde as mães e pais participam no sintoma da criança, talvez sem perceber e por esse motivo não existe clínica da criança sem as (os) responsáveis. Vale ressaltar, que durante a condução estamos lidando de maneira ampla sobre todo o contexto que ela está inserida, seja em família, na escola, nas amizades e podem sofrer interferências no seguimento que o sujeito terá por toda vida.
Na chegada a clínica, nos deparamos com falas queixosas de algumas (ns) cuidadoras (es) sobre o comportamento da criança. Espera-se que retiremos aquelas partes incômodas como algo palpável a percepção, mas é percebido também uma resistência em entender como foi desenvolvido aquele comportamento. Aqui podemos pensar que estamos lidando com a falta, uma vez que essa criança não corresponde aquela completude e desejo das pessoas que exercem as funções materna e paterna, por isso ela é levada ao tratamento porque a criança está fazendo falta a alguém, ela está diferente da maneira que ela deveria se portar. Para a existência dessa criança é fundamental ela fazer falta a alguém porque esse alguém vai lhe oferecer os objetos pulsionais, como a voz, o olhar, a escuta para que o sujeito em sua vida adulta se perceba como um sujeito desejante. Cabe então entender o que as (os) responsáveis representam e qual é a função delas (es) para a criança e o que a criança representa para as (os) responsáveis até mesmo para que o tratamento não seja uma forma de condução do jeito que aqueles (as) responsáveis querem que a (o) filha (o) se apresente.
Referências
Couto, Daniela Paula do. (2017). Freud, Klein, Lacan e a constituição do sujeito.
Psicologia em Pesquisa, 11(1), 1-2. https://dx.doi.org/10.24879/201700110010094
Larissa Alves Santos
Graduada em psicologia. Psicanalista. Pós- graduanda em psicanálise com crianças e adolescentes- teoria e clínica.
Atuo em clínica com atendimento on-line e presencial para o público crianças , adolescentes e adultos.
@larissalvesantos
lalvespsi@gmail.com