EU NÃO TENHO O DOM DE GANHAR DINHEIRO

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@toniramosgoncalves*

Quando informei ao jornal que minha coluna, “NÃO É O GLOBAL”, passaria de semanal para quinzenal, senti-me órfão de mim mesmo. Talvez eu seja meu maior fã, mas muitos dirão que isso é Complexo de Narciso, pura vaidade, mas não é.

Há quase um ano, frequento as páginas do Jornal S’Passo e, subitamente, vejo-me interrompido nas minhas rotinas de terça-feira, dia exclusivo para escrever meus artigos, crônicas e alguns contos. Tinha se tornado algo mecânico. Apesar das muitas visualizações, não sei dizer se sou realmente lido pelos leitores. De repente, veio aquele vazio de incompletude. Sempre há a esperança de um pouco de atenção neste universo virtual de infinitas opções, mesmo que seja para ser esquecido no minuto (ou segundo) seguinte pelo insaciável navegador das redes sociais.

Como colaborador, não sou remunerado, então sou obrigado a me virar noutras profissões. Faz tempo que não publico um livro, mesmo sendo editor. E tornar-me educador não foi algo planejado, e essa transição leva tempo para adaptação. Tudo isso ocorre em meio às dificuldades naturais da vida e à tensa burocracia do Estado. Parece até novela mexicana, tamanha a dramaticidade de tudo. Perdem-se as ilusões, mas não a vontade de escrever. Mas a verdade é que nunca tive o dom de ganhar dinheiro.

Mas qual a compensação em escrever?

A fabulosa Clarice Lispector uma vez disse: “Eu escrevo para salvar a vida de alguém. Provavelmente a minha própria vida.” Para o recluso Dalton Trevisan, “escrever é a única justificativa para se manter vivo.” E é exatamente essa justificativa que me move. O ato de escrever, para mim, é uma forma de existir, de validar minha presença nesse mundo caótico e, muitas vezes, indiferente.

Cada palavra que coloco no papel é uma tentativa de entender e, quem sabe, transformar a realidade ao meu redor. Escrever é uma necessidade vital, um estímulo que me impele a registrar o efêmero, a eternizar o instante, a capturar a essência do que vejo e sinto. É um diálogo silencioso com o leitor, uma troca invisível de experiências, sentimentos e reflexões.

A mudança de periodicidade da coluna não diminui a importância do meu trabalho, mas sim, redefine o ritmo com que compartilho minhas ideias. Talvez seja uma oportunidade para aprofundar ainda mais meus textos, para mergulhar com mais intensidade nas questões que me inquietam e, quem sabe, tocar de forma mais profunda aqueles que me leem.

Enfim, escrever é mais do que uma profissão ou um hobby; é uma forma de existência. Em um mundo onde somos constantemente bombardeados por informações superficiais e efêmeras, escrever se torna um ato de coragem, um compromisso com a verdade e com a humanidade. É através da escrita que encontro sentido, que enfrento meus demônios e celebro minhas vitórias. E, enquanto houver um único leitor disposto a embarcar comigo nessa jornada, continuarei a escrever, quinzenalmente ou não, com a mesma paixão e dedicação de sempre.

Talvez ser escritor seja uma maldição.

* Toni Ramos Gonçalves (Não é o Global)

Historiador, Escritor, Editor, ex-presidente e um dos fundadores da Academia Itaunense de Letras – AILE.