O episódio da pichação na pista de skate da Praça Celi, denunciada pela Prefeitura em nota de repúdio no início da semana, é apenas mais um ato de depredação e vandalismo contra prédios públicos e particulares, que acontece com frequência na cidade. E serve também para fomentar um debate, principalmente entre os jovens, sobre seu estilo de vida, suas manifestações de contestação e de impressão de sua marca nas ruas. Grafite, pichação e arte de rua são manifestações artísticas que nasceram ou foram influenciadas pela cultura hip hop das comunidades periféricas de Nova Iorque nos anos de 1970. Especialistas nesse tipo de arte avaliam que a pichação é um estilo puramente brasileiro e é feito numa só cor, utilizando-se spray, rolo ou pincel. Tanto o grafite, como as pichações e outras artes de ruas têm sido comuns nas paisagens itaunenses.
A pista de skate, que é um ponto de encontro de jovens de várias partes da cidade e onde a pichação foi denunciada, está situada no final da Avenida Jove Soares, na conhecida Praça Celi. O lugar tem sido preferido pelas manifestações políticas de esquerda e movimentos culturais de arte popular, como batalha de MC’s, hip hop, street dance, performances teatrais etc. A Prefeitura, por meio de nota da Secretaria Municipal de Esportes e Lazer, tratou do ocorrido da pichação na pista de skate na manhã do dia 2 de maio com a publicação de uma nota nas redes sociais. “Os espaços públicos passaram e estão passando por reformas e revitalização para atender os anseios da comunidade, por isso é dever da população zelar pelo bem público e mantê-los preservados. A Prefeitura, por meio da Secretaria de Esportes repudia essa e qualquer ação de vandalismo ao patrimônio público que prejudica diretamente toda a população itaunense”, escreveu. A Secretaria de Esportes providenciou a repintura do local na tarde do dia 2.
Voz enfezada do vereador da direita
Na Câmara, o vereador de direita Kaio Guimarães (PSC) também falou do ato de vandalismo e demonstrando uma indignação inusitada afirmou que a pichação foi descoberta um dia depois da realização de um evento da “esquerda e da extrema esquerda de Itaúna”, sugerindo que o ato criminoso poderia ter sido feito por algum participante do mesmo.
O evento a que ele se referiu foi o “Meia Virada Cultural do Dia do Trabalhador”, que aconteceu no local no dia 1º de maio, promovido pelas esquerdas de Itaúna, com participação do gabinete da vereadora Edênia Alcântara (PDT). Houve apresentações artísticas e pronunciamentos políticos, além de uma atividade esportiva da comunidade LGBTQIA+, denominada “Gaymada”. A vereadora Edênia afirmou ao Jornal S’PASSO que alguns membros da direita estão tentando associar o ato de vandalismo com eventos de arte e política da esquerda, mas o que aconteceu no primeiro de maio “foi a realização de uma série de atividades de música, teatro, dança e a ‘gaymada”, da população LGBTQIA+, numa alegre confraternização e reflexão sobre essa data tão significativa”.
Pichação é arte, feita em prédios abandonados e em ruinas
O Jornal S’PASSO conversou com dois pichadores da cidade que não quiseram e não puderam, uma vez que são menores, ter os nomes publicados. Para eles, “pichação é sim uma forma de arte”, feita em prédios abandonados, ruínas, como intervenção de uma juventude que quer se mostrar através de símbolos e códigos. “O picho é a marca da galera ou de uma pessoa para se comunicar com outras”. Para esses, quem escreve suas letras ou faz seus desenhos em monumentos, prédios públicos e particulares apenas para sujar o espaço, é pessoa de mau caráter, que aproveita de sua condição ou situação vantajosa para poluir. Muitos desses não sabem nem escrever, não conhecem de arte”, afirmam.
Fazendo “show” e tentando queimar a esquerda
Um dos artistas do grafite em Itaúna, procurado pela reportagem, disse que diante da repercussão que foi dada à pichação na pista de skate, principalmente depois da fala do político da direita, “usando a situação pra fazer show e queimar a esquerda”, preferia não se manifestar.
A arte nos muros é a voz de quem não a tem na sociedade
O professor, músico e artista plástico Levy Vargas, participante de alguns murais da cidade, explicou que “grafite é arte e picho também”. A diferença, segundo sua avaliação, é se existe autorização ou não do dono da parede ou do muro. “Grafite é uma coisa mais elaborada que o Picho, que quase sempre é a assinatura de quem o fez. Há quem diga que o Picho é a voz daqueles que não têm voz na sociedade. Acho isso legítimo e uma coisa a ser refletida e considerada nessa nossa sociedade tão desigual. Mas acredito que a parede alheia deve ser respeitada. Respeito deve sempre ser uma via de mão dupla”, pontuou.