Pais de alunos da APAE de Itaúna denunciaram problemas graves no Programa Conduz, voltado para o transporte de pessoas com deficiência de locomoção, especialmente cadeirantes. Criado por iniciativa do vereador Gleison Fernandes – Gleissinho, o programa é operacionalizado pela ViaSul, concessionária de transporte coletivo, sob supervisão da Gerência de Trânsito e Transportes da Prefeitura.
Embora conte com van adaptada, fornecidas pela ViaSul, e com cartões de passagem gratuitos emitidos pela Prefeitura, as irregularidades na prestação do serviço têm gerado indignação. Entre as principais queixas estão atrasos frequentes, negativas de atendimento prioritário, redução no número de veículos e a utilização de vans em condições precárias, que comprometem a segurança dos passageiros.
As reclamações vieram à tona novamente após a publicação indignada de Viviane Mendes, mãe do pequeno Vinícius, que tem paralisia cerebral discinética. No vídeo divulgado pelas redes sociais a mãe da criança mostra seu filho suando e chorando e com uma escoliose grave na parte abdominal, devido à espera dentro da van disponibilizada pela empresa Viasul. O vídeo é gravado na porta da APAE e a mãe revoltada diz que o motorista estaria negando transportar a criança com mais agilidade devido aos problemas.
“Ele não pode chegar por último em casa, não é por mim, Deus sabe do meu coração e que não é por boa vida. Meu filho está aqui, suando, chorando, com uma escoliose deste tamanho. O meu filho é obrigado a chegar em casa por último por causa do orgulho do motorista, que não faz caso dele, que desfaz do meu filho está alegando que meu filho deveria ser o último. Eu como mãe devo aceitar essa situação”, diz Viviane no vídeo.
O Jornal S’Passo entrou em contato com a mãe do garoto para saber do cotidiano de seu filho e de outras situações vivenciadas por outros usuários do serviço. Viviane confirmou à reportagem que não apenas ela, mas diversas mães estão tendo dificuldades com horários e que isso vem ocorrendo há mais de três anos. Os usuários reclamam ainda que os motoristas escutam som alto e conversam ao telefone durante os percursos, causando risco aos deficientes transportados.
“Além das vans estarem com problemas sérios de segurança, como ausência de conectores e cintos de segurança, portas quebradas, elevador e rampas estragadas, os motoristas não são capacitados para este tipo de serviço. Esses motoristas fazem o trabalho porque tem que fazer, e na verdade não é assim, tem que ter amor com as crianças deficientes, que são constantemente negligenciados”.
Ainda de acordo com Viviane, o maior problema está relacionado à disponibilização dos vales transportes que não são suficientes. “Não podemos nem levar nossos filhos na igreja, porque chega ao fim do mês, o transporte não quer levar eles à escola”.
Outra mãe que preferiu não se identificar, disse que o programa deveria contar com cinco vans em circulação, mas na prática, apenas uma atende toda a cidade, causando atrasos e longas esperas em pontos de embarque e desembarque. “Crianças e cadeirantes ficam por horas aguardando o transporte, expostos à fome e até ao tempo. É uma situação desumana”, criticou
Acusações de boicote
Os pais de crianças deficientes alegam que a situação se agravou após 2021, quando a Federação das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado de Minas Gerais (FETRAM) perdeu na Justiça um processo que pedia o cancelamento do Programa Conduz. Segundo eles, a ViaSul, cuja propriedade está ligada ao presidente da FETRAM, estaria dificultando deliberadamente a execução do serviço. “Parece que após esse processo ser recusado, que eles simplesmente pararam de dar atenção ao Programa, deixando inclusive, os veículos sucateados, dia após dia”.
O autor do projeto conduz
À reportagem autor do Projeto de Lei, o vereador Gleissinho, revelou que o Programa Conduz, foi o estopim para que ele tivesse uma ruptura radical com o prefeito há dois anos. “Eu sempre disse para o Neider que o programa não deveria ser administrado pelo departamento de trânsito e sim pela secretaria de desenvolvimento social. Até porque, a lei já faz essa previsão”, explica.
Gleissinho conta ainda que como a sua insistência estava muito forte, o prefeito o colocou para fora da sala aos berros e diante de todos os vereadores que lá estavam. “Assim o Conduz continuou sendo muito mal administrado e em péssimo estado de funcionamento. O número de usuários caiu drasticamente de 108 para 41. A desculpa sempre foi a situação financeira da empresa, mas eu coloquei emendas nos orçamentos dos anos 2022, 2023, e agora em 2024 para a melhoria das vans. Mas os recursos nunca foram destinados para esse fim”.
Ainda segundo o vereador, o departamento de trânsito não ouve as pessoas com a humildade que se deveria. “É um lugar onde se defende muito mais aos interesses da empresa do que dos usuários”, lamenta.
O outro lado
Em nota a Viasul se limitou a dizer que os atendimentos são agendados pela Prefeitura, e que todos que são agendados são feitos. “Todos os cinco veículos têm menos de 10 anos, dentro do definido em contrato, e está prevista renovação de parte da frota no próximo ano. A acusação de boicote é completamente infundada. Nos esforçamos para atender a todos da melhor forma possível”, diz nota.
Ex-vereador diz que vans não tem selo do INMETRO e que Poder Judiciário deve atuar na penalização da empresa
O Jornal S’Passo entrevistou também o ex-vereador Anselmo Fabiano Santos, reconhecido como “Anselmo dos Bailes”. O ex-parlamentar, que também é deficiente físico, contou à reportagem que o Programa Conduz é um projeto sucedido do antigo “Van Porta a Porta”, por sua iniciativa em 2005, no governo do ex-prefeito Eugênio Pinto.
No ano de 2005, quando da implementação do programa, foi colocada apenas uma van, e acordado com a empresa Autotrans à época, que o aumento no número de veículos seria gradativo, de acordo com o aumento na demanda. Segundo Anselmo Fabiano, as vans que transitam pela cidade hoje estão sucateadas, amarradas com cordas e improvisadas, sendo praticamente as mesmas que foram implementadas à frota nos últimos anos.
“As vans também não contam com o selo do INMETRO, pois as adaptações nos veículos, não foram feitas em local adequado, foram feitas por um profissional que eu conheço, na garagem da empresa mesmo. Esse tipo de veículo precisa deste selo e não adianta a empresa dizer que não compensa financeiramente ela comprar o veículo para adaptar, porque eles ganham desconto das fábricas para isso.”
O ex-vereador diz ainda que a legislação atual prevê que todos os veículos adaptados devem ter elevadores hidráulicos, e não rampas. “Na cidade apenas uma van tem um elevador improvisado, que é de fundo de quintal, que não atende aos deficientes da cidade e causa riscos. Tenho inclusive relatos de cadeiras soltas em dentro dos veículos e falhas nesse elevador improvisado”.
Para Anselmo, a responsabilidade de requerer a aquisição de novos veículos têm que partir do próprio executivo municipal. Já a fiscalização cabe aos vereadores e as providências judiciais ao Poder Judiciário. “Até o momento não vejo nenhuma das esferas cumprindo seu papel. Precisamos de uma resposta do Judiciário, porque a qualquer momento haverá alguma tragédia, e só não ocorreu ainda por Deus”.