Prédio do Hospital velho terá de volta sua originalidade e altar centenário da antiga capela 

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Há 106 anos, era inaugurada uma das maiores obras beneméritas de Minas Gerais, estampada inclusive no Jornal “O Imparcial” como uma obra do Coronel Manoel Gonçalves de Souza Moreira, descrito como “um capitalista que levantou um hospital à sua custa para a pobreza”. 

Aquela era a Casa de Caridade Coronel Manoel Gonçalves, que contava com uma enfermaria para mulheres, outra para homens, uma sala de cirurgia, uma capela, quatro quartos particulares, cozinha independente, lavanderia, um quarto para religiosas, dois lavabos, quatro “water-closets”, duas banheiras completas, vestíbulo e sala para portaria, tudo separado por seis grandes corredores. 

A obra teve um custo total, à época, de cem contos de réis, o que, convertido para os dias atuais, daria a quantia de R$ 12.300.000,00. Se considerada a aplicação, eram raros os empresários que consumiam sua fortuna em donativos deste alcance. 

Conforme noticiado pelo Jornal S’Passo no final do ano passado, Itaúna vai fazer uma viagem no tempo e na história, já que a direção da Casa de Caridade Manoel Gonçalves vai restaurar o hospital antigo, que sofreu com as intempéries do tempo, restando hoje apenas suas ruínas. 

Estão sendo investidos na obra de restauração recursos da ordem de R$ 590 mil, sendo que, deste valor, R$ 200 mil são provenientes de emenda impositiva de vereadores e os outros R$ 390 mil, do Ministério Público, por meio das promotorias responsáveis pela promoção e defesa do patrimônio cultural do município. 

Samuel Nicomedes, da empresa Arque, é o responsável pela obra de restauração do Hospital Velho

De acordo com Samuel Nicomedes, responsável pelo projeto, já foram concluídos dois terços da concretagem da laje que divide o primeiro do segundo piso, e a previsão é de que até o final de fevereiro essa etapa seja finalizada. 

“O primeiro passo da obra, que estamos executando neste momento, é a reestruturação das ruínas, que visa manter e resgatar tudo o que foi demolido ou destruído com o passar do tempo”, explica. 

Samuel ainda esclarece que a próxima fase será a recuperação do reboco, a colocação do telhado e a restauração da fachada, que precisará de um apoio técnico para conservar todas as características e o layout originais. Questionado sobre o comprometimento da obra devido à idade, ele afirma que as estruturas estão intactas. 

“A estrutura está aqui há bastante tempo, mas essa obra antiga foi feita com muito carinho, e eu acredito que o Manoelzinho está nos dando apoio, pois as fundações e paredes estão todas íntegras; o que faltou foi vontade de realizar a obra. ” 

A conclusão das intervenções dependerá agora do pagamento do recurso de R$ 390 mil por parte do Ministério Público, que se encontra em recesso forense. “Acredita-se que, com o retorno desse recesso, possamos receber o recurso e adiantar os detalhes finais da obra”, finaliza. 

Novidades 

Conforme apurado pelo Jornal S’Passo, empresários e políticos da cidade se comprometeram a auxiliar com a destinação e doação de recursos financeiros próprios. Em breve, a Casa de Caridade Manoel Gonçalves divulgará um PIX solidário para arrecadação de valores para concluir o acabamento da obra. 

Outra novidade é que a Provedoria da Casa de Caridade Manoel Gonçalves, encaminhou um ofício à Secretaria Municipal de Cultura, solicitando a devolução do altar centenário, esculpido em madeira no estilo barroco, que ficava na capela do antigo hospital. Há alguns anos, o altar foi recolhido e ficou sob a responsabilidade da Secretaria, até que fosse dada outra serventia ao patrimônio histórico. 

“Por pouco”: autoridades manifestaram interesse de derrubar o patrimônio em 1982 

Uma reportagem publicada no jornal Estado de Minas em 14 de julho de 1982, escrita pelo jornalista João Gabriel, traz à tona um dilema enfrentado pela cidade na época: a preservação ou a demolição das ruínas do Hospital Velho, considerado o prédio mais antigo da cidade. 

A reportagem deixou clara a postura de José Juarez Silva, que estava à frente da Casa de Caridade em 1982. O provedor da instituição acreditava que, se os recursos estivessem disponíveis para restaurar o edifício, essa seria a solução ideal. No entanto, após consultar engenheiros, ficou claro que a restauração não era economicamente viável, levando-o a sugerir a demolição. Sua preocupação era otimizar os recursos para melhorar as condições do hospital e adquirir novos equipamentos para a cidade, como um CTI e raios-X, que eram necessidades mais urgentes para o atendimento à população. 

O professor Guaracy de Castro Nogueira, então reitor da Universidade de Itaúna e ex-provedor da Casa de Caridade naquela ocasião, também considerava que o edifício “era irrecuperável devido ao seu estado avançado de deterioração”. À época, muito influente, Dr. Guaracy até se opôs ao uso de recursos públicos para tentar salvar o prédio. Para ele, a prioridade deveria ser investir na infraestrutura educacional e hospitalar da cidade, como a expansão do hospital atual e a criação de novas instalações acadêmicas na Universidade de Itaúna. 

As opiniões variaram bastante entre os envolvidos. De um lado, havia alguns que defendem ativamente a preservação do prédio, ressaltando a importância histórica, arquitetônica e cultural do edifício e até acreditando que a recuperação era viável e essencial para a preservação da memória de Itaúna. 

Por outro lado, havia os que, embora reconhecessem a importância histórica do prédio, priorizavam questões práticas e de desenvolvimento da cidade, como a demolição do imóvel. Felizmente, passados muitos anos, a soberania popular prevaleceu sobre as vontades das chamadas “autoridades” e, hoje, a realidade é outra. O edifício histórico está prestes a voltar aos seus tempos de glória e requinte.