QUANDO AS LETRAS USAM GRAVATAS

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@toniramosgoncalves*

As Academias de Letras são instituições que, em teoria, deveriam ser espaços de consagração literária, para aqueles que se destacaram ao longo de sua carreira, e ter como objetivo promover a língua e a literatura de um país ou região. Porém, na maioria das vezes, são vistas como entidades elitistas (por grande parte da população), compostas por membros anciãos, que se preocupam mais com o prestígio e o poder que a associação lhes confere do que com o seu verdadeiro propósito. E quase sempre são eleitos sem nenhum currículo literário (isso quando convidados para ocupar uma cadeira), mas simplesmente por ser uma pessoa ilustre da sociedade, quase sempre magistrados, médicos e políticos.

Sua linguagem e suas práticas são frequentemente tão formais, até mesmo engessadas, com reuniões enfadonhas, que podem ser percebidas como distantes e desinteressantes do público em geral. Nesse sentido, tornam-se um ambiente em que as pessoas são excessivamente formais ou preocupadas com detalhes, uma rigidez de certas condutas e conservadorismo. A arte, e principalmente a literatura, não se limita a normas impostas por uma elite intelectual.

Outra crítica comum é que as Academias de Letras reforçam padrões literários e linguísticos conservadores, tornando-se resistentes a novas ideias e mudanças. Ao se concentrarem em preservar as tradições linguísticas e literárias, muitas vezes desconsideram as mudanças sociais e culturais que ocorrem na língua e na literatura, provocando, assim, a falta de diversidade e inclusão. Isso pode levar a uma visão limitada e distorcida do que é a língua e a literatura, além de limitar as oportunidades para escritores e linguistas de comunidades marginalizadas.

Mas, será que eles sabem o verdadeiro significado da Literatura?

A verdadeira literatura é rebelde e não se submete a padrões preestabelecidos. Ela é capaz de explorar a complexidade da vida humana, provocar reflexões e emocionar o leitor. As letras não podem ser contidas por convenções. Quando as letras usam gravatas, elas mostram que a literatura não é apenas uma questão de estilo, mas sim uma forma de resistência política e cultural. Elas denunciam a exclusão e a opressão presentes nas Academias de Letras e reafirmam a importância da diversidade e da pluralidade na produção literária.

Assim, a literatura é uma forma de poder e pode ser uma forma de resistência contra o poder. É verdade que, sem o acesso das minorias, ela pode ser usada para legitimar a opressão e a discriminação, apresentando pessoas marginalizadas como inferiores ou problemáticas. Porém, é importante lembrar que a literatura pode ser também uma forma de empoderamento para indivíduos e grupos marginalizados. Autores que escrevem sobre suas experiências de marginalização e discriminação podem dar voz a grupos que são frequentemente silenciados ou subrepresentados na sociedade. Além disso, pode ser uma ferramenta para educar e conscientizar o público sobre questões sociais importantes, como diversidade, igualdade e inclusão. Portanto, é crucial que as minorias tenham acesso à literatura e sejam representadas nela e por ela a fim de ampliar a compreensão e construir uma sociedade mais justa e igualitária.

Wesley Barbosa, escritor de literatura periférica, que já vendeu mais de 10 mil cópias de seus livros em produções independentes, enfatiza a importância da literatura em sua vida. O autor acredita que a produção de poetas e romancistas periféricos é crucial para identificar o ambiente em que vivemos. A escrita e a leitura podem nos ajudar a superar a fome, o abandono e a miséria, proporcionando uma reflexão mais profunda sobre a nossa própria realidade, ressalta ele. Além disso, a literatura pode nos oferecer uma nova perspectiva sobre as nossas vidas, permitindo-nos explorar diferentes ideias e pontos de vista, segundo Wesley Barbosa, que crê na literatura como uma das formas mais poderosas de arte, nos inspirando, ensinando e desafiando a pensar de maneiras novas e criativas.

No entanto, nota-se que nem todas as Academias de Letras são iguais e que algumas têm trabalhado para se tornarem mais inclusivas e abertas a novas ideias e perspectivas. Algumas têm reconhecido a necessidade de se adaptarem às mudanças culturais e linguísticas, tornando-se mais relevantes para o público em geral. A literatura deve ser livre e acessível a todos, sem preconceitos ou discriminação.

Em resumo, enquanto as Academias de Letras têm o potencial de serem instituições valiosas para a promoção da língua e da literatura, é importante considerar suas limitações e críticas. A excessiva formalidade, o conservadorismo e a falta de diversidade podem limitar o alcance e a relevância dessas agremiações. Portanto, é preciso que trabalhem para incluir uma variedade de vozes e perspectivas em suas atividades.

* Toni Ramos Gonçalves

Ex-presidente e um dos fundadores da Academia Itaunense de Letras

Graduando em História e Jornalismo.