QUE HISTÓRIA É ESSA?

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Sílvio Bernardes

smabernardes@hotmail.com

A ponta do durex, a falta do abridor de latas e outros problemas

De primeiro, como diz o outro, havia dificuldades de toda sorte que complicavam a vida da gente. A primeira delas, de difícil solução, era lidar com a fita durex. Achar a ponta do durex era muito complicado e nos fazia perder tempo, se escabelar e até xingar nome feio. Mas, na ordem de dificuldades, podemos colocar também a falta do abridor de latas. Como abrir a lata de sardinhas sem o abridor? Muitos não o tinham (ele era muito caro) e em algumas situações, quando se tinha, ele simplesmente criava pernas ou asas, e desaparecia. A mãe fazia desse jeito: pegava a latinha e ralava a parte de cima dela na pedra de amolar, depois, com uma faca, abria. Vez ou outra essa tarefa machucava a mão da mãe, que reclamava a falta do abridor – e dizia alguns impropérios contra tudo e todos.  Abrir garrafas de vinho – Chapinha ou Do Sul – sem o saca-rolha era um problemão, embora não constituísse impedimento para muitos adultos, que arrumavam uma maneira de tirar a rolha do vinho e entornassem goela adentro o líquido avermelhado. O povo cortava a rolha com uma faca e empurrava o resto para dentro da garrafa. Outros pegavam uma toalha, faziam uma trouxa, punha na parede e batia o fundo da garrafa até que a rolha se soltasse. Muitas vezes perdia-se grande quantidade de vinho, o que o povo achava um dó. Um desperdício. Uma puta sacanagem. Abrir o Vidro de azeitona era difícil demais da conta. Parece que a coisa só ia depois de muita reza, xingamento e ameaça de “tacar ele na parede”.

A gente sofria muito. Calça sem fecho éclair, camisa sem botão, meia furada, calção sem elástico. Tudo isso descoberto – ou lembrado – na hora de sair. Eu fui um menino que custei muito a aprender dar o nó no cadarço do sapato e até hoje não sei fazer o laço da gravata. Aliás, não uso muito gravata e, como dizia o Carlito Maia, “me dá um nó na garganta”. Mas, havia muito menino da minha turma que ainda não sabia se limpar sozinho – “mãe, cabei!” –, fazia xixi na cama e vez ou outra a mãe ia esfregar as orelhas, lavar a cabeça, tirar o macuco daquele menino imundo. Dizem que eu custei largar a chupeta e parei de chupar o dedo somente quando quebrei o braço “já um cavalão”.

No Grupo Escolar, o maior “pobrema” era esquecer de fazer o ‘para casa’. A gente levava castigo na escola e espinafração da mãe em casa.

 – Professora, alguém pode ser castigado por algo que não fez? 

– Não, Silvinho, claro que não pode. Por que você pergunta?

– Então, fessora, é que eu não fiz o meu ‘para casa’.

– !!!!

No grupo escolar era uma dificuldade o entendimento da gente com a tabuada. “Meninos, os fatos fundamentais”, era a professora anunciando cheia de si – com um ar de incrível sadismo – e a gente tentando se esconder atrás do coleguinha da frente. Rezando para ela não nos descobrir.

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