Sílvio Bernardes
É batata!
De primeiro o povo mais antigo dizia que a noite de 24 de junho, dia de São João, era a mais fria do ano. E, acrescentavam os antigos que essa noite era a mais longa dos 365 dias. Minha mãe, muito chegada a essas coisas de santos, contava que São João Batista, o aniversariante do dia 24, gostava tanto de festa que se soubesse da data dos seus anos, viria do céu para a terra soltando foguetes, fazendo fogueiras, que queimava o mundo inteiro. Por isso a mãe dele, a Santa Isabel, fazia-o dormir na véspera e só acordar na noite do dia seguinte, quando já tivesse passado o seu aniversário. Pode não ser verdade essa história, mas até o Martinho da Vila contou isso (aliás, cantou), juntamente com o João Nogueira em “João e José” (1976) “(…) E tanta fogueira/ que queimava o mundo/ diz a lenda”. Um povo que não conhecia cientificamente de meteorologia, mas que sabia das coisas, entendia o céu com prenúncio de chuva: “céu pedrento, chuva de vento”, contavam. E olhando o avermelhado da tarde num céu de grande beleza, vaticinavam convictos: “a noite hoje é de muito frio. É batata, batatíssima!”. A lua, em determinada de suas fases, era boa para isso e para aquilo outro, mas não era recomendada para o plantio ou para o corte dos cabelos.
Conheci um senhor que sabia que iria chover de acordo com o seu calo. Se ele estava doendo de um jeito diferente (?) era chuva na certa, afirmava com seriedade e certeza. Esse homem, criado na roça, olhava o sol e indicava a hora – às vezes certa, às vezes com algum equívoco. “Relógio que atrasa não adianta”, como dizia outro filósofo popular conhecido pela alcunha de Mineirinho.
São também do povo de antigamente os conhecimentos sobre época de chuva. Em março era a enchente das goiabas. E chovia sem parar nesse tempo. No dia de São José, 19 do mês três, chovia, com certeza. E, se caísse água no dia de Imaculada Conceição, em 8 de dezembro, certamente haveria chuva no dia 25, Dia de Natal. E de primeiro as águas de março vinham fechar o verão e trazer as promessas de vida para o nosso coração, como dissera o maestro Tom Jobim.
Diz a sabedoria popular que quem vê cara não vê coração – e que o coração é terra que ninguém visita –, mas eu conheci um sujeito que dizia que pelos olhos podia avaliar a intimidade do outro. “Gente que fica te olhando muito, cuidado. Se o olhar for de piedade, de cachorro pedindo comida, então, cai fora. Vai te trazer mal olhado. É gente ruim. Se olhar para uma planta, seca na hora, pode colocar no fogo”, ensinavam.
Coruja piando na cerca era sinal de mau agouro. Alguém da casa iria morrer. É batata! Batatíssima! Criança que vê algo de comer e não lhe é dado, agua, o pescoço afina, a orelha cresce, fica mirradinho, aguado. Criança que brinca com fogo, faz xixi na cama. Pular sobre uma criança e não despular, faz a criança não crescer, fica pequetito para sempre, quem nem o autor dessas notas. Também não cresce nunca a criança que coloca a peneira na cabeça. Andar com mão na cabeça faz a mãe de quem andou morrer. É verdade, quero ver minha mãe morta atrás da porta…