QUE HISTÓRIA É ESSA

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Sílvio Bernardes

O mágico Baratinha e sua trupe

A publicação do livro que conta os 140 anos  da História do Teatro de Itaúna está devendo um capítulo dedicado aos artistas populares  das artes cênicas de nossa cidade. Anônimos, efêmeros, sem nenhuma ou pouca técnica, homens e mulheres da comédia, dos dramalhões, da arte circense, da pantomima, da mágica, das emboladas musicais e do clown, estiveram presentes em muitos momentos da vida artística de Itaúna nos anos de 1960 e 1970. Não havia palcos estruturados, com proscênio, ribalta, refletores, rotunda, ciclorama, não tinham os nossos artistas populares diretores competentes que os dirigissem, nem contrarregras, sonoplastas, iluminadores que os auxiliassem nas suas performances. A maquiagem, muitas vezes rudimentar como nos circos de cavalinhos, era feita por eles mesmos, com material ordinário. Os textos eram recheados de cacos e muitos improvisos. Nossos artistas faziam sua arte em riba de caminhões, de carros-veraneios, de palanques de madeira das quermesses da Igreja – que o povo, de primeiro, chamava de “barraquinha” – ou num ajuntamento de pessoas no meio da praça, da rua, bem no estilo das primeiras encenações na Grécia de Téspis (século VI a.C.).

Sim, tivemos muitos desses Téspis por aí, para nossa alegria. O principal deles, na minha opinião foi o baiano-itaunense Salatiel Silva, mais conhecido por Batatinha. O homem era mágico, ator, contador de estórias, músico, cantador de emboladas, pescador, embromeiro e um adorável saltimbanco. Onde chegava com sua tralha reunia uma porção de gente de todas as idades, especialmente crianças de calças curtas e de pés no chão, como eu e minha turma (minha patota). O Baratinha fazia menino botar ovo e diferençar a própria voz, cuspia fogo, dominava a técnica da ilusão e deixava todo mundo com uma cara de espanto em cada uma de suas presepadas. Baratinha era um showman, mas, de vez em quando, dividia seu palco com outros artistas de sua corriola, igualmente queridos pela população simples da minha meninice, como o Naningo Neto (radialista, cantor, compositor e humorista), o Picolino (palhaço e contador de causos), Eliseu Pereira (radialista e comediante), Inhá-Tuca (comediante), Chico Chocalho (palhaço), Mineirinho (radialista, ator e contador de causos), Cosme Silva (radialista, escritor, poeta e contador de causos), entre outros. Era uma festa quando esses artistas se apresentavam, juntos e misturados ou em espetáculo solo. Inesquecível os números de palhaçada do Picolino e da Inhá-Tuca. Impagável ver o Naningo Neto contando seus causos ou rasgando a cantoria com a “Sanfona da Véia” nas barraquinhas de Santo Antônio.

Lá na Vila Mozart, com frequência, se instalava no terreno onde hoje é o Centro Social Urbano, um parque de diversões. O Parque do Moleza. E o Moleza era o artista da vez. Cantava, contava piadas e apresentava suas performances incríveis de palhaçada.

Depois de assistir a esses artistas a gente chegava em casa e queria reproduzir sua arte. Cantar as coisas engraçadas que eles cantavam, contar as piadas sem graça que eles contavam, fazer as imitações e tentar, talvez, ser um pouco desses palhaços das perdidas ilusões. Chegávamos a montar no quintal o nosso circo e o nosso palco para os “grandes espetáculos” dos moleques de joelho ralado e de dedão do pé machucado. Era só alegria aquela nossa palhaçada.