Que história é essa?

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Sílvio Bernardes

smabernardes@hotmail.com

Nem que a vaca tussa

Eu nunca soube com quantos paus se faz uma canoa – e assistindo, outro dia, ao épico filme “Noé”, vi que o herói bíblico gastou uma floresta inteira para construir aquela arca. Muito pau, véio. É pau pra toda obra. Também não descobri ainda o que é bom pra tosse e jamais confirmei se é devera que a vaca tussa. Até hoje não sei quando é que a porca torce o rabo. E a que horas a onça vai beber água. Eu sou lá amigo da onça? Sei de nada. Posso ter visto a avó atrás do toco, mas nunca vi minha avó pela greta. Também não vi merda e não cacei um pau para subir. Mandaram-me, um dia, pentear macaco. E, noutra vez, “ver se eu tô lá na esquina”. Chupar prego, também. E lamber sabão, pouco depois de ordenarem com certa rispidez: “vá tomar banho”. Eu não, mamar na gata cê não quer, bebé! Não quero. Dizem que eu estou mais perdido que cego em tiroteio. Coitado, não de mim, do cego. Estou mais por fora do que cotovelo de motorista. Tá certo, eu peguei o bonde andando. Dormi no ponto. Marquei touca. Acho que tô numa sinuca de bico, no c* do Zé Fel. Olha só, o trem é feio e a nossa batata tá assando. Mas, como diz o outro, a vida é bela, nóis é que empetec’ela.

De primeiro, falavam que fulano era louco de jogar pedra, de rasgar dinheiro e de comer cocô. “É, sim. Já teve internado no Galba Veloso. Toma Gardenal e tudo. É doidinho da silva”, “tá com um parafuso a menos”. Mas falavam demais e quem fala demais dá bom dia a cavalo. Fala pelos cotovelos e acaba levando tinta. Eu não, sô! Não falo essa boca é minha. Sei que o povo de antigamente tratava a gente assim ó (balançava a mão espalmada), carregava água no balaio para ver a gente bem, fazia das tripas coração. Mas tinha gente que vinha com o angu pronto enquanto o outro ainda estava trazendo o fubá. Vê se pode uma coisa dessa? Tem gente que é danada. Dá nó em pingo d’água. “Ah, meninada de uma figa, cês tá tudo no meu caderno, escritinho e bunitinho. Quando eu  pegar ocêis, não haverá santo pra  ajudar”.

De primeiro, eu pegava o boi com chifre e tudo. Era um goela. Se chorava, era de barriga cheia. A mãe falava que eu tinha o olho maior que a barriga. E cabelo na venta. E bicho de carpinteiro. E que havia comido canela de cachorro. Era um moleque da pá virada, do c* riscado.

Eu não tinha um tostão. Um tostão furado. Em menino eu era um pé rapado. Quebrado. “Eu sou pobre, pobre, pobre/ De marré, marré, marré./ Eu sou pobre, pobre, pobre/ De marré deci”. Sem eira nem beira. Mas era papudo. Engabelador. Arrastador de mala. Cheio de nove horas. Eu era pequeno, não tinha talco, mamãe passou açúcar (refinado, é lógico) em mim.