Educação de Tempo Integral do Estado põe à mostra prédios sucateados e evasão escolar

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Alunos tiveram aulas de empreendedorismo, sustentabilidade e sobre as profissões do futuro

Há poucos meses a deputada estadual Lohanna França (PV) denunciou o estado de abandono de alguns prédios de escolas da Rede Estadual em Itaúna, inclusive com fácil acesso para ação de vândalos e, até, de usuários de drogas em suas dependências.

Foi em 2015, que o governo do Estado implantou em suas instituições a escola de tempo integral para oferecer aos alunos possibilidades de, além do período normal de ensino, uma educação com carga horária extraclasse que contribuísse para o desenvolvimento intelectual e social do estudante. Nesse tipo de ensino, as crianças e os adolescentes permanecem na escola por um período mais longo do que a carga horária regular. Na teoria, a Escola Integral propõe ser contemporânea, inclusiva e atender à equidade entre os alunos.

Quem conta sobre a experiência da implantação do projeto em Itaúna é o professor de História e bacharel em Direito, Luiz Mascarenhas, que à época do início do projeto, era diretor da Escola Estadual Professora Gilka Drumond de Faria, no bairro Nogueira Machado. Nesta instituição, o projeto foi implantado de forma pioneira. 

Vários encontros e muitas dúvidas

O professor Luiz conta que em 2015, a Escola Professora Gilka Drumond foi contatada pela Secretaria Estadual de Educação para que ele, como gestor, participasse de encontros em Belo Horizonte, onde já estava sendo estudada há vários anos a implantação do Tempo Integral. A princípio, como todo novo projeto, surgiram muitas dúvidas sobre a implantação deste projeto na Escola Gilka Drumond.

“Para falar a verdade, as disciplinas não letivas, que seriam oferecidas no Tempo Integral, não eram muito atrativas para a nossa realidade. Pela minha experiência de muitos anos na educação, entendemos que muitas vezes são feitos grandes projetos, que carecem de um entendimento maior sobre a necessidade de cada região do Estado. Então, fazer um projeto único, que sirva para todo o Estado, é um tanto quanto complicado, pois o mesmo não pode ser flexibilizado por todas as comunidades escolares. No nosso tempo como gestor, isso foi muito falado; participamos de inúmeros encontros, capacitações, direto na Secretaria Educação e, na época, na gestão do então governador Fernando Pimentel, as superintendências ficaram meio desinformadas acerca da comunicação que era feita entre a Secretaria de Estado da Educação e escolas. Muitas vezes, eu tinha informações que a nossa superintendente ainda não tinha. Isto gerou, durante a implantação do projeto, diversos obstáculos. Percebi que as comunidades escolares não são ouvidas. Alguém projeta algo e isso vem como uma imposição nas escolas. Não podemos comparar, por exemplo, a região do Vale do Jequitinhonha com a região onde nos encontramos, pois as realidades são diferentes”, relatou.

Evasão escolar

Na avaliação do ex-diretor, o projeto foi implantado “a duras penas” e por ter sido iniciado de modo quase que imposto, gerou uma evasão escolar muito grande, porque as realidades das diversas regiões do Estado são diferentes. Segundo ele, há comunidades em que o adolescente, já têm ocupação no contraturno das aulas e aquele pouco dinheiro que ele recebe, leva para casa e faz falta à sua família. Isto era pouco entendido pelas altas esferas da educação. Em outras realidades, o Tempo Integral veio sanar muitas demandas porque, sem dúvida, o lugar do aluno é na escola. Mas tem muitas regiões que não oferecem nenhuma oportunidade para o aluno; já na nossa, temos, por exemplo, o programa Menor Aprendiz, que abre portas para que essas famílias de baixa renda completem o orçamento com o trabalho dos filhos. Logicamente isto reflete uma falha do sistema porque essas famílias não deveriam estar passando por essas necessidades e terem de colocar os filhos para o trabalho antes do momento adequado. Têm pessoas que querem comparar, sempre, os dias de hoje com os de 30, 40 anos atrás.  São pessoas mal informadas, saudosistas, que querem fazer um anacronismo nos tempos presentes. Cada tempo, cada contexto com a sua realidade, como costumo dizer como professor de História. Hoje, quando o adolescente vai para o mercado de trabalho, ele não completa os estudos e nunca vai se capacitar para entrar de fato numa carreira profissional que propicie a ele um futuro melhor”, argumenta.

Escolas sem nenhuma infraestrutura

Enfim, o Tempo Integral foi chegando e se impondo como uma tendência mundial, mas na opinião do professor Luiz Mascarenhas, “é mais um laboratório de ideias e ainda são necessárias muitas adaptações, até dos espaços físicos. Como você coloca o Tempo Integral em escolas das décadas de 70, 80, sem nenhuma infraestrutura para que o aluno permaneça ali até o período da tarde?

Escolas que não têm um vestiário adequado, que não oferecem oportunidade de um banho ou de higiene adequada. Muitas vezes, se mascara e maquia a realidade com palavras e ideias bonitas que não são a realidade de muitas comunidades. Às vezes, numa escola você tem uma aparelhagem digital moderna, mas o telhado e a parte elétrica e hidráulica estão podres. Então, há muito o que fazer, um longo caminho a trilhar para que o Tempo Integral realmente seja um ensino de qualidade oferecido a todos os nossos alunos”, enfatiza.

A pandemia e outros fatores desestimularam alunos da Escola Estadual de Itaúna

A situação da Escola Estadual de Itaúna, uma das mais tradicionais da cidade, não é muito diferente da trazida pelo professor Luiz Mascarenhas sobre a instituição Gilka Drumond. O diretor José Ronaldo Gonçalves de Oliveira afirma que na escola, o Ensino Médio Tempo Integral iniciou em 2021 com quatro turmas do primeiro ano, em plena pandemia da Covid-19.  Os alunos se matricularam e fizeram o 1º ano em regime remoto. “Quando voltou o regime presencial, já estávamos quase no fim do ano, muitos alunos abandonaram os estudos ou pediram transferência. Para o 2º ano, com início em 2022, tivemos uma redução considerável de matrículas, houve um número elevado de pedidos de transferência e as quatro turmas de 1º ano se fundiram em apenas três de 2º ano. Este ano, temos apenas uma turma de 3º ano que irá concluir o ensino médio em tempo integral”, revela.

Ensino profissionalizante

A Escola Estadual de Itaúna iniciou este ano o ensino médio em tempo integral, profissionalizante em logística. “Este sim teve uma boa aceitação e até o momento as turmas estão completas. Para a comunidade, a implantação do médio integral profissionalizante foi um ganho muito grande, uma vez que o aluno tem todo apoio necessário ao seu desenvolvimento. Aqui aluno faz até quatro refeições diárias, além de todo o acompanhamento necessário para o seu crescimento intelectual e profissional. Como eu disse, essa é uma realidade da Escola Estadual de Itaúna, que está fazendo várias parcerias com a comunidade e empresas para que esses alunos com formação técnica terminem o Ensino Médio preparados para o mercado de trabalho”, ressalta.

SECRETÁRIO DE EDUCAÇÃO WESLEI LOPES

Diferente da Rede Estadual, nas escolas do município o “Tempo Integral” foi bem sucedido

O Projeto Tempo Integral da prefeitura acolhe crianças e adolescentes que se encaixem em alguns critérios como o cadastro no “Programa Bolsa Família”.

Mantido no contraturno escolar, o Tempo Integral no município oferece Estudos Orientados, Leitura e Produção Textual, Laboratório de Matemática, Esporte e Recreação, Cultura e Saberes em Arte, e Educação para a Cidadania.

Segundo o secretário municipal de Educação, Weslei Lopes, atualmente 13 escolas oferecem o atendimento em tempo integral, sendo cinco instituições localizadas na zona rural e oito na área urbana. Destas escolas, onze oferecem vagas do 1º ao 5º Ano do Ensino Fundamental I, duas oferecem vagas do 6º ao 9º Ano do Ensino Fundamental II, e uma oferece vagas para o público da Pré-escola, na Educação Infantil.

Zona rural como precursora

O Projeto Tempo Integral iniciou na rede municipal na década de 1990, tendo as escolas dos povoados de Campos, Vista Alegre e Córrego do Soldado como precursoras. Logo depois, houve a oferta na Escola Municipal Dona Dorica, a Granja Escola São José, com a posterior ampliação nas escolas da Zona Urbana.

Em 2008 aconteceu a intensificação do projeto, através do Programa Mais Educação, como estratégia do governo federal, via Ministério da Educação. No entanto, a partir de 2011, quando os critérios passaram a ser escolas de baixo IDEB ou localizadas em territórios de vulnerabilidade social, Itaúna deixou de ser contemplada pelo Programa Mais Educação. Porém, o município entendeu a importância do projeto e optou por sua manutenção, com a utilização de recursos próprios”, explica.

890 estudantes beneficiados e cerca de 50 profissionais atuando no projeto

São contemplados com o Tempo Integral cerca de 890 alunos da rede pública municipal e aproximadamente 50 profissionais estão atuando exclusivamente no projeto.

Para o secretário Weslei, o projeto traz muitos aspectos positivos, a começar pela promoção do desenvolvimento global dos alunos – intelectual, físico, cultural, social e emocional – por meio de atividades no contraturno escolar que complementam as propostas pedagógicas da escola. “Além disso, a própria rotina, com horários distribuídos em diferentes atividades, favorece o desenvolvimento de sujeitos autônomos, uma vez que ocorre o incentivo da interação com os pares, a prática de exercícios e o contato com a natureza, dentre outras habilidades”, salienta.

Município vai ampliar atendimento e mais de mil alunos estarão no “Tempo Integral”

O prefeito Neider Moreira (PSD) enfatiza que diferente do Estado, Itaúna tem dado certo no projeto da educação de tempo integral nas escolas da rede porque o município “está fazendo o seu dever de casa”.

E a expectativa é que o número de alunos atendidos, hoje em torno de 900, seja ampliado em mais 130 vagas, ultrapassando a marca de mil estudantes. “Nós temos investido neste projeto e não é somente em espaço físico, mas também no aspecto pedagógico. Infelizmente o Estado deixa de atender às suas demandas, como nas instituições das polícias Militar e Civil, jogando a responsabilidade nas contas do município.