A cidade de Itaúna se ressente há muito tempo de um novo Plano Diretor, que irá disciplinar as estruturas físicas e sociais do município, oportunizando resolver os principais gargalos que dificultam o crescimento do município. Especialistas em urbanismo, meio ambiente e arquitetura, empresários, pessoas da comunidade e políticos de um modo geral têm opinado sobre o tema, ainda que de forma bastante acanhada.
O secretário de Regulação Urbana, Paulo de Tarso, explica para a reportagem que em 2017 o Executivo formou uma equipe técnica multidisciplinar para trabalhar no processo de revisão do Plano Diretor, mas o Ministério Público apresentou recomendação para que fosse apresentado diagnóstico urbanístico ambiental para a região da Barragem, por causa do interesse turístico e ambiental na área. Tarso conta que a administração licitou a contratação da empresa D’Ávila Arquitetura, que realizou o estudo diagnóstico de toda a região. “O trabalho foi elaborado por empresa capacitada e o atual Plano Diretor apresentado à Câmara Municipal foi feito seguindo as diretrizes legais”, pontuou. O secretário ressalta que a prefeitura aguarda a tramitação do Projeto de Lei Complementar 20/2019 e a consequente aprovação do Plano Diretor para, em seguida, proceder com a atualização das Leis Complementares que são o Código de Obras, Lei de Uso e Ocupação do Solo e Código de Parcelamento do Solo, garantindo maior eficiência na gestão do solo urbano.
Como afirmou o arquiteto e urbanista, professor do curso de Engenharia da Universidade de Itaúna, Fábio de Macedo Corradi, se não houver o envolvimento da sociedade com o tema não adianta ter um Plano Diretor. Segundo o profissional, a maioria das pessoas acha que será definido somente um código de obras, que é um instrumento de regulação do uso e ocupação do solo com a implantação de construções. No entendimento dele, o Plano Diretor vai muito além de um código de obras. Ele define o ordenamento e crescimento das cidades, a partir de diretrizes contidas nos âmbitos social, ambiental, de segurança, econômico etc. Estas diretrizes são estabelecidas por um amplo levantamento de dados referentes ao município, que serão captados junto a órgãos públicos, como sindicatos, polícia, entidades sociais, órgãos de saúde, secretarias municipais e estaduais. Para o professor Fábio Corradi, há que se ressaltar também os aspectos técnicos, como medição de trânsito, levantamentos de bairros, de áreas degradadas, definição de uso água e esgoto, entre outras. Estas diretrizes devem ter ampla participação da sociedade civil.
Falta recursos e profissionais competentes
“A diferença é que com o plano diretor essas diretrizes ficam explícitas, disponíveis ao cidadão para criticar, compreender e atuar sob “regras do jogo” que estão bem definidas. Fica mais complicado para os gestores dos municípios fazerem políticas que favoreçam determinados grupos de seu interesse partidário e ideológico. O plano torna-se uma lei municipal, elaborada pela prefeitura) e aprovada pelos vereadores, o que faz com que os gestores municipais fiquem atrelados a estas diretrizes. O descumprimento destas leis leva até à intervenção do mandato político”, avaliou.
O professor acredita que a maioria dos municípios não cumpre a lei de elaboração do Plano Diretor por falta de recursos e de profissionais competentes. Daí, improvisam-se e vão enrolando até que o mandato termine e não se cumpre a lei. Ele ressalta ainda que o Plano Diretor irá promover qualidade de vida e impedir o crescimento desenfreado que favoreça uma parcela da sociedade em prejuízo de outra. “Ele irá possibilitar a criação de bases para uma cidade sustentável, uma cidade inclusiva, equilibrada, que promova qualidade de vida, definindo como queremos que seja a “cara” de nossas cidades para as futuras gerações. Através dele, há distribuição de forma justa dos custos e benefícios da urbanização. Além disso, o Plano Diretor fornece a transparência para a política de planejamento urbano, ao instituí-la em forma de lei”, ressalta.
Vereadores não querem se comprometer porque não entendem a verdadeira importância do Plano Diretor
O professor do curso de Arquitetura da Universidade de Itaúna, Sérgio Machado, contou ao Jornal S’PASSO que a demora na aprovação do plano diretor tem um ponto positivo: evitou-se, até aqui, a aprovação de um documento cheio de lacunas e equívocos, sem unidade e sem direção. No seu entendimento, a demora foi resultado de duas questões principais: primeiramente, as dificuldades do poder público em montar uma estratégia de participação da sociedade nas discussões, determinada pela Constituição e que, de fato é uma tarefa complexa. Mesmo assim, não se buscou ajuda e, para piorar, a saída encontrada foi tentar contornar a lei federal e manipular o processo. O Ministério Público não se deixou enganar e cobrou medidas: ao invés de trabalhar efetivamente, o Executivo ficou paralisado, o que ele diz não compreender. O segundo motivo, no seu entendimento, foi a dificuldade de entender e debater uma lei como o Plano Diretor. Ela possui aspectos técnicos que demandam tempo e trabalho e os vereadores, desta e das legislaturas anteriores, não se envolveram na medida necessária. “Então, falta convicção. Creio que existe um temor por parte de alguns vereadores, em se comprometer com algo que ainda não entendem muito bem”, considera.
Para Machado, o problema do Plano Diretor não são os remendos. O plano proposto é, em si, uma colcha de retalhos. “É um “plano” sem planejamento, onde o futuro de Itaúna é o acaso, a não ser que a nossa meta seja construir uma cidade industrial do século dezenove, o que dá na mesma”, analisa.
O professor afirma que os vereadores estão prestes a aprovar uma lei que sonha um município que atraia turistas, mas que identifica uma única área de interesse turístico: a Barragem. No seu entendimento, ao aprovar o Plano, eles estarão abraçando a segregação social, consolidando a ocupação de áreas distantes do centro pelos mais pobres. Estarão assinando um plano que ignora completamente a zona rural, o que beira à ilegalidade. “Sem perceber, os vereadores estarão colocando em risco o nosso futuro, ao aprovar uma enorme expansão da zona urbana, que pode levar o município a complicações financeiras e mesmo à ingovernabilidade. Tais possibilidades, graves e reais, indicam que, pelo menos uma conversa envolvendo cidadãos comprometidos com Itaúna, especialistas e lideranças, deveria ser promovida”, salienta.
O Plano Diretor recebeu considerações do Ministério Público e, no entendimento de Sérgio Machado, isso se deve a duas questões: à exigência de que o Plano seja participativo, como manda a Constituição, e o desenvolvimento de uma solução para a Barragem que vá além da sua transformação num loteamento vulgar. O Executivo insiste numa proposta, que para ele é medíocre, para a Barragem, “pois nem explora de modo inteligente o potencial econômico da área e nem dá uma resposta ambiental evoluída”. Com relação à ausência de participação popular, ele atribui à falta de humildade do poder público. Acerca dos prejuízos decorrentes da morosidade em se resolver a situação do Plano Diretor, o arquiteto se posiciona de forma cética. “Diz-se por aí que o atraso prejudica os negócios imobiliários, afirmação que carece de comprovação. Na minha visão, ele pode, no máximo, retardar o atendimento de interesses particulares, sem qualquer benefício coletivo”, afirmou.
O professor Sérgio Machado acredita que existe um prejuízo, muito maior por não ter um Plano que “seja de fato diretor”, pois Itaúna não se posiciona no contexto regional e mesmo estadual, deixando o seu futuro nas mãos de decisões empresariais externas e distantes. “Ao não se propor seriamente um plano que nos deixe senhores da nossa própria história, aí sim, estamos perdendo um tempo precioso. Não será surpresa se formos varridos pela onda de transformações sociais, tecnológicas e econômicas que se avizinha e nos tornarmos uma cidade irrelevante”, alerta.
Entre os principais gargalos que o Plano Diretor deveria corrigir em Itaúna, a sustentabilidade é o principal, na opinião de Machado. É necessário a criação de condições para o bem-estar futuro dos itaunenses, que viabilizem a sua permanência e a de seus filhos, aqui. Para isso seria preciso inovar na busca da prosperidade e criar ótimas condições ambientais na cidade e no campo. Ou seja, Itaúna deveria ser tratada não como uma unidade administrativa ou como um condomínio, mas como a casa de uma comunidade, além de ser acolhedora para os visitantes. A atual proposta do Plano não demonstra ter compreensão das necessidades da nossa terra ou preocupação concreta com o futuro das pessoas que vivem aqui.
Neider afirma que Plano Diretor está pronto para ser votado pelos vereadores
Nas palavras do prefeito Neider Moreira (PSD), o Plano Diretor é um tema complexo e é necessário ouvir da melhor maneira possível as considerações, tanto do pessoal técnico, quanto dos empreendedores. E observar as ponderações de uns e outros. “Em função disso, a gente tem procurado escutar, através de reuniões setoriais, através de audiências públicas, ouvindo empresas especializadas a respeito, que foram contratadas para tratar do assunto. Por isso, a demora. Mas agora o Plano Diretor encontra-se absolutamente concluído, passou por todas as etapas”, contou. O prefeito disse que a situação está concluída e organizada, inclusive com documentos, para que a Câmara possa votá-lo. A população espera que ele seja apreciado, para que ela tenha a revisão do Plano Diretor concluída.
O novo projeto não tem remendos, afirma o prefeito Neider, o que existe é um estudo profundo que foi realizado para que a cidade tenha “o melhor Plano Diretor possível”. Sobre a interferência do Ministério Público, o chefe do executivo afirma que ele tem o direito de achar que alguma questão possa estar equivocada, mas quem tem a prerrogativa de encaminhar o projeto de lei à Câmara é o prefeito. E quem tem a competência de apreciá-lo é a Câmara de Vereadores. “É isso que a Constituição prevê. Se o promotor entende que algo não está de acordo, ele pode questionar isso na Justiça”, pontua.
O prefeito salienta que o adiamento da votação do Plano Diretor faz com que empreendedores tenham que adiar projetos até que ele seja concluído. Na sua opinião isso não é positivo, até mesmo pela demora em corrigir situações pontuais no município, com antigos gargalos, que precisam corrigidos para o uso e ocupação dos espaços. O Plano Diretor serve de balizamento para poder fazer, através de leis complementares, uma série de atualizações, como o código de obras e o código de posturas. “Então, a expectativa que existe por parte da sociedade para a revisão do Plano Diretor é muito grande. Também por parte da administração municipal, para poder fazer as atualizações nessas leis”, salientou.