QUE HISTÓRIA É ESSA?

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 Eu aqui, como meu jovem amigo, tô “caçando indaca”

Sílvio Bernardes

Outro dia a postagem (no ‘Insta’) de um jovem amigo chamou-me a atenção pela palavra inusitada (especialmente para um rapaz quase imberbe) que ele tomou emprestada: ‘indaca’. Parece-me que ele escreveu algo do tipo: “tô aqui arrumando umas indacas” – referindo-se a uns arranjos musicais de sua autoria. Minha mãe, há muitos anos, usava com frequência a expressão “caçar indaca” e também dizia que seus filhos eram uns “imbondeiros”,  “caçadores de imbondo”.   Foi com a minha mãe, uma mestra pouco letrada, que aprendi grandes coisas da vida – valores que valem a pena nas relações humanas (aqui incluem também aqueles serumaninhos que miam e latem e que falam outras línguas) –, além dessas expressões interessantes, incomuns nos dias de hoje. Por isso, a estranheza de ver o jovem Bemoreira usar a tal da “indaca”. E no seu dia a dia a Dona Luzia falava um colosso de coisas e nóis entendia tudo: ‘ingronga’ (“ô ingronga”!), “comeu canela de cachorro (dos filhos que viviam na rua), “breguete”, ‘perrada’, ‘despinguelado’ (“desceu despinguelado o Morro da Júlia, passou pelo Zé da Cezelina e foi parar lá na Maria do Nego”); “matraca véia’, “dormir com o coro quente” (ui!). E tinha também algumas expressões bastante apropriadas: “fii da égua”, “cambada de sacana”, “barrigada perdida”, “trem à toa”, “peste dosinferno”, “olho maior que a barriga”, “casa dozoto” etc.

Naqueles tempos um fulano de tal que era presunçoso e, por vezes, arrogante, era um ‘metido a bom de cela’, um “contador de papo”, ‘arrastador de mala’. Desse tipo, uns eram ‘cheios de nove horas’, ‘embruião’, ‘embromeiro’ ou ‘embromador’. E os “bão da boca”, de comprovada competência, era um “nego duro”, como dizia o Célio Calambau ou como gritava o locutor dos rodeios da “equipe do Zé Capitão” lá no campo da Várzea: “cutuca, Quirino! Ô nego duro!”. Moço bonito era “um pão”, mulher arrumadinha era ‘cocota’ ou ‘cocotinha’, mas muito arrumada, com detalhes espalhafatosos na cabeça, na cara e nas roupas, era ‘baranga’. Mulher feia, ‘tribufu’; bonita, ‘princesa’ ou ‘gatinha’; nova era ‘broto’; velha, ‘canhão’. Apaixonar era ‘gamar’. A cada tempo eu era gamado numa novinha, às vezes de carne e osso, da minha cidade; noutras, as da televisão, como a Renée de Vielmond, a Elisabeth Savalla, a Françoise Fourton, a Lídia Brondi, a Isadora Ribeiro, a menininha do comercial…

O salário – ‘de fichado’ e o ‘dimenor’ – era ‘ordenado’, os de aposentados (do ‘IAPI’) era ‘pensão’, alguns, do ‘montepio’. O contracheque era ‘holerite’, ou ‘foia de pagamento’. E havia algumas expressões não muito felizes como as da morte. “Esse sujeito é de morte”, “a carestia tá brava e a vida tá pela hora da morte”. Morrer era “bater as botas”, “usar o paletó de madeira”, “abotoar o paletó”, “ir pra cidade dos pés juntos”, “partir dessa pra melhor” ou – perdão! – “comer capim pela raiz”. Passar a noite no velório – muito comum naqueles tempos, bebendo e comendo à noite toda, às custas da família do falecido – “era fazer quarto”, “fazer quarto do defunto”.

Por fim, ir à praia era “tomar banho de mar”. O banheiro da casa era o “quarto de banho” e a copa, a “sala de jantar”, que ficava para além da “sala de estar”.

É só por agora, dado o adiantado da hora.

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