Que história é essa? Ambientes de merd…

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Sílvio Bernardes

smabernardes@hotmail.com

Os mictórios ou, vá lá, as instalações sanitárias, de alguns bares, botecos, lanchonetes etc., são uns verdadeiros ambientes de merda. É um mal necessário. A gente comparece porque está apertado. Houve uma época em que eu, velho frequentador de botecos – e, por extensão, de banheiros de botecos – quis protestar contra a falta de investimentos dos donos dos estabelecimentos, que na minha opinião ganhavam rios de dinheiro com o seu negócio, naquele espaço tão visitado (e necessário) quanto as mesas em que bebia, comia, confraternizava religiosamente uma plêiade de botequeiros. Os sanitários eram quase sempre sujos, fedidos, não havia papel higiênico – muitas vezes tiras de jornal penduradas nas paredes encardidas serviam à função – e invariavelmente a descarga estava com defeito. Mas a gente ia e quando sóbrio, era uma aventura inesquecível. Não raro, o freguês ia dar uma mijada, acabava vomitando por ali de tanto nojo.

Em menino eu tinha até medo de certos banheiros desses botequins da vida. Ali na Praça do Capeta, por exemplo, num bar de grande frequência de bebuns e boêmios, o banheiro sujo ficava no quintal, um pouco abaixo do nível do prédio, e nele se chegava por uma pequena escada de madeira, extremamente vulnerável, do tipo balança-mas-não-cai. Volta e meia um freguês meio chapado errava um dos degraus e se esborrachava no chão às escuras e igualmente sujo. Mas era tudo uma farra, já que a maioria dos fregueses do lugar não dava a mínima para essas dificuldades. Levantava, sacudia a poeira e seguia rumo à casinha para descarregar o excesso de água do joelho. Às vezes em gargalhadas com a própria situação.

Na Praça da Matriz, num dos mais tradicionais estabelecimentos comerciais preferidos pela boemia, o banheiro era o último dos lugares que muitos gostariam de ir, não fosse a necessidade premente, que ocorria com muita frequência. Não havia vaso sanitário como os de hoje, mas uma latrina no chão e para se cagar, o freguês tinha que ficar de cócoras, quase que dentro do trem. Conta-se que certa vez um sujeito pequetito não fora visto agachado naquele sanitário sem iluminação e ganhara involuntariamente um jato de urina na cabeça de um colega já bastante alterado pelo álcool. Também naquela praça, num banheiro de uma certa lanchonete, alguns “artistas de merda” escreviam bobagens ou riscavam com os dedos sujos de cocô uma arte abstrata e degradante nas paredes encardidas. E houve por ali noutros tempos o boteco do Onofre Bacaiau, onde o banheiro não era tão acessível ao grande número de habitués. Quem entrava no sanitário do boteco do Onofre podia ler uma placa curiosa e que hoje pode soar como ecologicamente correta: “somente urina não precisa dar descarga”.

Pelos botequins da vida havia sempre um banheiro sujo e fedido, mas, justiça seja feita, eram poucos os que se queixavam dessa ambientação desagradável. E tem mais, ninguém vai a um bar para visitar o sanitário. Ou vai? E como cantou a  Rita Lee: “o vinho branco, a cachaça, o chope escuro, a gente importante ou a gente simples, tudo vira bosta”.