Sílvio Bernardes
Diz a sabedoria popular que “rir é o melhor remédio”. Não é o único – me disse uma vez o saudoso ator Rogério Cardoso, numa entrevista para o jornal “Trolha Popular” –, mas é o melhor. O jornalista Millôr Fernandes (1923-2012) escreveu que “o homem é o único animal que ri… e é rindo que ele mostra o animal que é!”. Nesses tempos de covid-19, o já famoso novo coronavírus (sic), quando muitas pessoas sentem-se ameaçadas e fundamente desamparadas (à iminência do desespero, que não é bom companheiro), o melhor é rir. Desanuviar a cabeça e desopilar o fígado. Fazer humor não é desdenhar o vírus e seus efeitos para o ser humano, muito menos relativizar a gravidade dos problemas no mundo inteiro. Rir não é debochar. Sorrir para descontrair, para não enlouquecer, para buscar forças e superar. Então, é assim, rir para o outro e não rir do outro. Rir e cuidar-se. Rir e cuidar (do outro).
Assim, eu rio. As redes sociais nos fazem rir (em diversas oportunidades), e aliviam a pressão dos problemas de toda sorte (ahn?). Acho muito engraçadas e criativas certas postagens no feicibuqui, no uatsápi, no instagran sobre a crise. Todas as crises. Outro dia um aluno veio me mostrar uma: o cara dizia que com essa mania de lavar as mãos e de usar álcool gel constantemente descobrira em sua destra “uma cola da sétima série”, que ele fez para a prova de História. Sobre lavar as mãos, outro dia li a preocupação do seu Mário, ainda nos primeiros dias de isolamento social. “Será que já podemos tomar banho ou é apenas para continuar somente lavando as mãos? Não tô vendo ninguém falar nada sobre isso.”, observou bem observado. A dona Manuela, aqui mesmo da cidade, foi à loja comprar um novo chuveiro. Custou a sair de casa com medo de ser pega pelo vírus. Mas foi, com medo e tudo. Colocou máscara – feita por ela mesma, com uma caixinha de leite vazia –, luvas, lenço no cabelo, óculos de sol, capa de chuva e sombrinha. Mas, coitada, desistiu de comprar o chuveiro. Dizem que ela contou para o neto, em casa: “Fio, foi um sinal. Batata! Oiei lá e só tinha uma marca: Corona. Com uns trens escrivinhados embaixo, em letras bem miúdas: ‘made in China’. Pelamor de Deus, oia que trem mais esquisito. É ou não é um sinal pra eu não comprar? Corona, vê se pode um trem desse? Vou ficar com meu chuveiro antigo mesmo, da marca Loren e Zete”. Um colega professor compartilhou em seu feicibuqui essa postagem: “Nós aqui em casa, de quarentena, tamo que nem pinto de granja, acende a luz nóis come, apaga a luz, nóis dorme”.
E as máscaras contra a covid-19? Ah, as máscaras! Eu que trabalho com máscaras (até literalmente) em minhas aulas de teatro rio demais com algumas pessoas usando máscaras, sobretudo a forma como as utilizam. Não posso deixar de falar que a confecção e o material que as pessoas usam para as máscaras tem me feito rir muito. Racho os bicos, como diz o outro. Na câmara municipal mesmo, outro dia, os vereadores nos divertiram à beça quando expuseram suas dificuldades em lidar com as máscaras. Punham-nas no queixo, na cabeça, nos olhos, puxavam-nas pela frente, colocavam-nas sobre a mesa… e depois na cara de novo. É claro que era o primeiro dia da exigência das máscaras. Foram chamados à atenção por uma colega edil, que é profissional de saúde e que sabe lidar melhor com o equipamento de proteção individual.
A recomendação de que devemos ficar em casa é justa, é muito justa, é justíssima, como diria aquele personagem da antiga novela. Porém, algumas pessoas relutam, são inconsequentes, desobedientes. Querem é sair por aí, batendo perna feito uma batuíra ou um grou. Mas, outras obedecem às autoridades sanitárias criteriosamente. Em casa ficam à vontade. Sentem-se em casa, literalmente. Até juntam a essa alegria e bem-estar uma musiquinha do passado – aliás uma marchinha de 1950: “Daqui não saio, daqui ninguém me tira! Daqui não saio, daqui ninguém me tira!”. E, mineiramente, decretam: “dendicasa é dendicasa, num é na casa do zôto não! Tendeu?”.
*Essa crônica foi publicada em abril de 2020, quando a Covid-19 estava dando seus primeiros sinais entre nós, sem, ainda, ter causado a grande devastação que viria acontecer nos meses seguintes.