Vídeo do governador Zema diz que crianças não precisam apresentar cartão de vacina para se matricularem nas escolas

Fala foi feita essa semana ao lado do senador mineiro Cleitinho e do deputado federal Nikolas Ferreira

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Alguns políticos reagiram com estranheza e, até, com indignação diante da fala – e de um vídeo compartilhado em redes sociais em todo o país – do governador Romeu Zema (NOVO), juntamente com o senador Cleitinho Azevedo (Republicanos) e o deputado federal Nikolas Ferreira (PL), para comemorar a informação de que, em Minas, não será obrigatório apresentar comprovante de vacinação para se matricular na rede estadual de ensino. “Em Minas, todo aluno, independentemente de ter ou não vacinado, terá acesso às escolas”, disse o governador.

“Uma fala eleitoreira do mais baixo nível”

O Jornal S’PASSO ouviu algumas autoridades sobre o assunto confirmando que não foram bem aceitas as manifestações dos três políticos marcando o início do ano letivo nas escolas da rede pública estadual.

Para o infectologista e professor universitário Unaí Tupinambás, é impressionante que tenhamos que voltar a esse debate da vacina e da segurança em saúde. “Eu achei, sinceramente, que já havíamos superado esse debate, principalmente depois do que nós passamos nos últimos três anos com a pandemia da Covid. A gente pode perceber o que foi a pandemia antes e depois da vacinação. No entanto, essa postura do governador, do senador e do deputado, é eleitoreira do mais baixo nível. As vacinações que estão no Programa Nacional de Imunização (PNI), e a da Covid está, são obrigatórias, estão previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente. Os pais ou responsáveis que não vacinam têm que responder às sanções. A criança não se vacina, vai para a escola pega a doença e a leva para sua casa, seus avós, para as pessoas mais vulnerabilizadas. Então, é uma postura vil, eleitoreira e quando a pessoa é negacionista, terraplanista, tudo bem, é um problema dela, agora, quando é negacionista do ponto de vista de vacina, é crime, e pode levar à morte”, posiciona.

Esperando uma posição do MP contra o vídeo do governador

O médico Unaí afirma que espera uma posição do Ministério Público de Minas Gerais diante da situação, pois “essas pessoas precisam ser contidas”. Alguns políticos mineiros ajuizaram representação contra o vídeo do Zema, Cleitinho e Nikolas. Neste ano eleitoral, o médico acredita que veremos situações como essas e a proliferação das mentiras por todo lado. “Isso, para manter aquela parcela da população radicalizada, mobilizada, acaba afetando outras pessoas que, inseguras, fazem diminuir a vacinação. Felizmente agora, com o novo governo, o Brasil voltou com o aumento pela procura da vacina, estamos alcançando bons índices naquelas vacinas do PNI do SUS. Eu espero que essa fala irresponsável e eleitoreira fique contida somente naquele nicho do seu eleitorado mais radical”, reforçou.

Combater a desinformação

Unaí Tupinambás traz dados do Ministério da Saúde de 2023 de mais de 5 mil casos de uma doença respiratória grave em crianças e adolescentes, com cerca de 150 mortes, ou o equivalente a uma morte a cada dois dias. Ele lembra também de uma síndrome respiratória multisistêmica muito prevalente. “E o pior é que desde 2022 há uma tendência de aumento. Nós temos que combater esse tipo de desinformação. Outro dado importante do Ministério da Saúde, depois dessas 47 milhões de doses de vacina na população menor que 18 anos, não há nenhuma morte. Tivemos alguns efeitos colaterais, nenhum grave. E lembrando a população de Itaúna, qualquer medicamento tem efeito colateral: Aspirina, Novalgina, todos têm, e na vacina os efeitos prevalentes foram dor de cabeça, dor no corpo, mal estar, outro caso mais moderado e nenhum evoluiu para o óbito. Ou seja, os benefícios da vacina nessa faixa etária superam e a gente tem percebido o aumento de casos de Covid também, além da Dengue. E a tendência é aumentar depois do carnaval. A gente faz um apelo aos pais e demais responsáveis que levem seus filhos e atualizem o calendário vacinal o mais rápido possível”, orienta.

Fala negacionista, desrespeitosa e criminosa

A deputada estadual Lohanna França (PV) rebateu a fala e o vídeo do governador e dos dois políticos bolsonaristas com outro vídeo e mostrou que, ao contrário dos mesmos, estava colocando em dia sua vacinação contra a Covid. Ao Jornal S’PASSO a parlamentar afirmou que a princípio viu a manifestação do chefe do executivo mineiro como desrespeitosa e negacionista, que propaga a desinformação, além de desestimular as pessoas a se vacinarem. “Mas, se a gente olhar num aspecto mais profundo, ela é uma fala criminosa, que desrespeita o Estatuto da Criança e do Adolescente. E é uma fala muito séria porque em nenhum momento o governador e os dois políticos que estão com ele se posicionam sobre a vacina da Covid; se fosse apenas essa, já seria errado, criminoso, desrespeitoso, espalhando desinformação. Ele fala apenas em vacina, então, a gente precisa lembrar que o Sarampo está voltando, a Caxumba está voltando, que tantas doenças, como a Poliomielite, que estavam superadas, estão voltando. São doenças seriíssimas que estamos enfrentando e a vacina foi fundamental para que tenhamos a sensação de segurança. Com a baixa adesão da vacinação, essas doenças voltam e quando o governador fala vacina, ele se torna responsável por crianças que podem ter sequelas daqui a alguns meses ou anos, porque os pais acreditaram que não era importante vacinar”, salientou.

Governador vai contra a lei estadual

Para o secretário municipal de Saúde, Fernando Meira de Faria, a fala do governador, acompanhado dos parlamentares Cleitinho e Nikolas, traz uma preocupação, uma vez que existe uma lei estadual, de 2012, que obriga as instituições de ensino a cobrarem dos pais a carteira de vacinação completa para crianças até dez anos.

“A gente fica com receio de esse tipo de fala ser interpretada como argumento favorável a esses movimentos que são antivacina, desestimulando as pessoas a procurarem a imunização. Isso não contribui para aquilo que a gente quer, que é aumentar o índice de cobertura vacinal. Apesar de respeitar as liberdades individuais e não querer entrar muito no mérito, acho que todo esforço neste momento, principalmente agora que temos também uma vacina contra a Dengue, deve ser o de estimular a vacinação, aumentar as coberturas vacinais e controlar as doenças que antes eram controladas com o imunizante e que agora estão voltando devido a esse tipo de conduta, de desestímulo à vacinação”, esclareceu.

A escola como instrumento para a garantia da saúde

Já o secretário municipal de Educação, Weslei Lopes pontua que a Saúde, assim como a Educação, é um direito fundamental de nossas crianças e estudantes. “A Escola, assim como a própria comunicação pública, podem ser importantes instrumentos para a garantia da saúde desse público. Seguiremos, na Educação, valorizando as ações que beneficiam a comunidade escolar e a população do Município”, disse.

Comissão de Saúde não se manifesta

O presidente da Comissão de Saúde da Câmara Municipal, vereador Aristides Ribeiro (PSC), o Tidinho, não respondeu à reportagem o Jornal S’PASSO.

Fala mal colocada que só corrobora o negacionismo

O prefeito Neider Moreira (PSD), que é médico, afirmou que a fala do governador Zema, seguida dos dois parlamentares, foi “extremamente mal colocada”. O cartão de vacinação atualizado é fundamental para crianças de, pelo menos, até os dez anos. E para isso, é necessário estimular os pais a vacinarem suas crianças. “Nós, em Itaúna, vamos continuar mantendo a obrigatoriedade, essa cobrança é feita de seis em seis meses para acompanharmos isso e manter uma cobertura vacinal adequada para o bem-estar das crianças. Achei muito ruim a fala do governador, muito mal colocada , além de criar desestímulo à vacinação, que é fundamental para a proteção das crianças ante doenças potenciais, que podem levar inclusive a óbito. Enquanto o Brasil está tentando recuperar o Programa Nacional de Imunização –  PNI, uma fala dessa só corrobora o negacionismo”, opinou.