Sete perguntas para o professor e presidente do Instituto Municipal da Previdência – IMP, Heli de Souza Maia

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Heli de Souza Maia é o atual diretor do IMP – Instituto Municipal da Previdência, ex-secretário de Educação e Cultura, de Assistência Social e de Assuntos Comunitários. É professor da rede pública e privada e advogado. Mestre em Direito, Pós-graduado em História, Graduado em Direito e em Ciências Sociais. É autor dos livros Bullying e Atividade empresária e sustentabilidade ambiental. Tem extensa participação em seminários, cursos e congressos sobre previdência pública.

1- Heli, como está a situação da reforma do IMP em Itaúna? O que falta ainda para que o projeto de lei seja colocado em votação? Após as manifestações dos vereadores, o que virá em seguida?

Inicialmente a reforma da previdência dos servidores públicos de Itaúna interessa ao Poder Público, aos servidores e também à sociedade itaunense, embora ela não tenha se manifestado. Tanto é verdade isso que os próprios servidores municipais que assinaram artigo publicado pelo Jornal S’PASSO textualmente disseram em documento enviado ao Poder Executivo que “é necessário garantir a participação da sociedade no sentido de construir alternativas que venham melhorar o Sistema do Regime Próprio de Previdência Social”. E eles têm razão pois, quem financia o sistema previdenciário é a sociedade através dos impostos que ela tem que recolher aos cofres públicos. Ademais, quando se apura déficit, é a sociedade que tem que pagar por ele, sendo os órgãos públicos meros intermediários.

Em segundo lugar, registro que foi enviado um Projeto de Lei de autoria do Poder Executivo à Câmara, seguindo o que está na Emenda Constitucional 103. O referido projeto não saiu da bestunta de “a” ou “b”. Houve manifestação do Conselho administrativo formado exclusivamente por servidores efetivos, que entenderam ser necessária a reforma. Solicitei ao Presidente da Câmara a suspensão temporária da tramitação do referido projeto e instituímos um Grupo de Trabalho formado, exclusivamente, por servidores efetivos para que o analisassem e apresentassem sugestões para sua melhoria. Ao término dos trabalhos, o relatório final e uma possível minuta de projeto de lei será apresentada ao Conselho Administrativo que, por força de lei, tem que deliberar sobre o mesmo. Em seguida, o Poder Executivo o analisará para verificar se é exequível.

Faço a seguinte ressalva e “mea culpa”: este Grupo para ser democrático e atender os ditames legais deveria contar com representantes do Poder Executivo, do Poder Legislativo e da sociedade, e não apenas de servidores, como indicou os autores do artigo publicado no Jornal S´Passo.

Em um terceiro momento ou haverá o envio de um projeto substitutivo ou a proposição de emendas pelos vereadores. Os edis poderão rejeitá-lo, modificá-lo ou aprová-lo e então, a seguir, entra em vigência.

2- Em linhas gerais e de forma mais clara, o que representa o IMP e o que pretende essa sua reforma? 

Talvez alguns não saibam, mas o IMP equivale ao INSS. O IMP é o órgão que cuida dos benefícios previdenciários dos servidores efetivos municipais de Itaúna. Entretanto, como dizem as normas constitucionais e infraconstitucionais, ele deve ser gerido por representantes do empregador (poder público municipal) e “empregados” (servidores efetivos). Os dois, poder público e servidores, financiam o sistema. Seria preciso incluir um terceiro ator, a sociedade, pois ela, indiretamente, é que financia o sistema. O IMP conta com vários órgãos colegiados como o Conselho Administrativo, formado exclusivamente, por servidores efetivos e que tem caráter deliberativo, e a Diretoria Executiva, como o nome diz, executa. Além disso, os atos da Diretoria Executiva são alvo de intenso controle, através do Conselho Fiscal, da Câmara Municipal, do Ministério Público, do Tribunal de Contas do Estado e do Ministério da Economia, através da Secretaria de Previdência.

Quero registrar também nossa preocupação com a transparência. Quando assumimos o IMP, em 2017, o site tinha pouquíssimas informações. Hoje, as atas, movimentações financeiras, balanços, e todos os outros documentos, são disponibilizados no site, ao contrário do que encontramos quando assumimos. Tudo está ótimo? Não. Estamos em constante busca de melhorias, afinal, como disse Baumam, a mudança é a única coisa permanente.

A reforma da previdência não é do IMP e sim da sociedade itaunense. Hoje, o IMP goza de boa saúde financeira. A grande questão é o déficit atuarial, que não pode ser confundido com déficit financeiro, inexistente. Quem gere previdência não pode fixar os olhos apenas no presente e nem ficar com os olhos no retrovisor. Tem que mirar o futuro. E este olhar para o futuro está relacionado com o déficit atuarial. Estudos apontavam um déficit atuarial de aproximadamente R$ 160 milhões e, com a reforma feita ano passado, o déficit caiu para noventa e sete milhões. E são esses milhões que Prefeitura, Saae e Câmara tem que repassar ao IMP.

A reforma que foi proposta altera a idade de aposentadoria para sessenta e cinco anos, se homem, e mulheres para sessenta e dois, com redução de cinco anos para professores. Foi introduzida a aposentaria para deficientes que terão regras mais benéficas, até então inexistentes. Também estão presentes normas que beneficiam os servidores expostos a agentes nocivos à saúde.

Importante destacar que tais regras só valem para quem ingressar no serviço público após a sanção da nova lei. Os que já estão terão regras de transição. A reforma pretende cumprir o que determina a Constituição Federal em seu artigo 40, quando trata do equilíbrio financeiro e atuarial. Pretende ainda que o sistema previdenciário municipal seja sustentável não apenas hoje, mas também no futuro.

Como diz um amigo, reforma da previdência é matemática. A população itaunense, como a brasileira em geral, passa por um processo de envelhecimento, de aumento de expectativa de vida. Isso por si só exige a reforma da previdência.

Para se ter uma ideia, em Itaúna, antigamente haviam mais de doze servidores efetivos para cada aposentado ou pensionista. Hoje, essa relação é de aproximadamente, três por um. Quem se dispuser a abandonar as ideias pré-concebidas, verá que, matematicamente, a conta não fecha. E olha que aconteceram muitas nomeações para cargos efetivos. Não basta nomear cada vez mais, pois isso resolve a curto e médio prazo, mas não resolve o déficit atuarial a longo prazo.

3- Se não for realizada a aprovação do novo IMP, como é o desejo do governo municipal, o que acontecerá para administração pública e para os servidores municipais?

Caso não seja aprovado o PL como foi enviado, a administração pública terá que continuar fazendo aportes financeiros ao IMP para cobrir o déficit financeiro para que o regime seja sustentável hoje e no futuro. Para se ter uma ideia, tomando o déficit existente hoje de quase R$ 100 milhões em 2022, só de juros, sem pagar o principal, serão quase R$ 6 milhões, dinheiro este que terá que ser retirado de outras áreas de investimento que o município faria.

Para os servidores públicos a não aprovação significa que, no futuro, o IMP poderá não ser sustentável, como tem ocorrido em alguns municípios e estados, como se viu no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul.

4- Qual é a verdadeira participação dos servidores municipais na elaboração do novo plano do IMP e nas discussões posteriores? Pode-se falar em perdas e ganhos para eles com o IMP pós-reforma?

Como se sabe a Administração Pública está condicionada ao cumprimento da lei e este é o caso da reforma da previdência. O artigo 40 da Constituição determina que haja o equilíbrio financeiro e atuarial. Mesmo com a reforma feita ano passado ainda persiste um déficit de quase R$ 100 milhões e, ao adotar as regras da Emenda Constitucional, ainda haverá déficit, mas sem ela, ele aumenta.

No IMP existem vários conselhos e dentre eles o Conselho Administrativo que analisou a proposta de reforma, portanto houve sim discussão com os servidores, através de seus representantes. No entanto, alguns servidores não se sentem representados nesse colegiado e enviaram um requerimento ao Poder Executivo para que fossem ouvidos. Atendendo ao pleito, o IMP constituiu um grupo de trabalho, como já disse. Esperamos que assim os dois mil servidores ativos e inativos possam se sentir representados na discussão, nos debates.

Reitero que é muito importante que todos os dois mil servidores participem intensamente do debate posto. Mas que tenham em mente a sustentabilidade do regime próprio de previdência a longo prazo e não apenas buscando soluções para o presente. Posso dizer que fiquei admirado positivamente com a atitude republicana dos servidores que assinaram o artigo publicado nesse jornal e que hoje integram o Grupo de Trabalho da Previdência instituído pelo IMP, quando solicitam a inclusão da sociedade itaunense no debate do assunto. Isto revela compromisso com os servidores e também com toda a sociedade.

5- Mudando de assunto, você é professor e foi também secretário de Educação, no governo de Eugênio Pinto. Que avaliação você faz acerca das propostas do momento, de retorno às aulas presenciais em plena alta da pandemia da Covid-19? 

O Prefeito, o Secretário de Saúde têm tido uma conduta exemplar em relação a esse assunto. Foram estabelecidos protocolos sanitários para serem observados quando do retorno das aulas. Concordo com eles que ainda não é o momento, devemos aguardar um pouco mais até que Itaúna saia da onda atual e com a vacinação cobrindo a maior parte da população.

6- Ex-militante de esquerda e engajado em movimentos populares na cidade, Heli Maia é hoje um servidor municipal que agrada mais os interesses do poder executivo. Isso é verdade? Qual é a sua opinião acerca das críticas de antigos companheiros e até mesmo de servidores municipais?

Eu faço parte do Poder Executivo e como gestor estou obrigado a seguir a lei. Todos sabem que o cidadão pode fazer tudo aquilo que não é proibido por lei, enquanto nós só podemos fazer aquilo que está previsto em lei, ou o que a lei manda que façamos. A Constituição Federal e as normas infraconstitucionais nos impõem exigências que devem ser realizadas. Como expus antes, a reforma da previdência é necessária, independente de eu ser de esquerda. Não é uma pauta só da direita.

Meus companheiros de esquerda se lembram perfeitamente das reformas da previdência nos Governos do Presidente Lula e da Presidenta Dilma. Outro exemplo atual é o da reforma feita pelo Governador do Maranhão Flávio Dino, do PCdoB.

Vários municípios geridos por partidos de esquerda fizeram a reforma previdenciária. Ademais, gosto sempre de frisar que pela minha formação em Direito e em Ciências Sociais tenho uma visão holística da situação. De maneira especial, enquanto professor de Geografia desde a década de 1990, já discutíamos em sala de aula com os alunos a necessidade da reforma da previdência, em virtude da alteração da pirâmide etária com o envelhecimento demográfico e a redução da população jovem, ou seja, daquela entre 0 a 19 anos.

Quanto as críticas, elas são recebidas com tranquilidade mesmo quando não respeitam a urbanidade. Entendo a preocupação daqueles servidores que se sentem prejudicados com a reforma da previdência e daqueles que não têm interesse em compreender a diferença entre direito adquirido e expectativa de direito.

7- Tantas vezes na linha de frente de campanhas políticas, como você vê o atual cenário como preparação para as próximas disputas eleitorais? Itaúna caminha para a reafirmação de seu viés conservador de direita ou ainda há chances para o surgimento de uma liderança progressista?  

Em minha modesta opinião temos um país marcado por uma polarização que teve início sobretudo com a derrota de Aécio Neves para Dilma. A partir daí, houve a construção de um fosso. Não bastasse isso, os últimos anos são marcados por um negacionismo exacerbado. A ciência tem sido alvo de ataques. E aqui não apenas as ciências da saúde, mas também as ciências jurídicas e aqui ressalto a indisposição de alguns que são contra a reforma, parecem desacreditar na ciência atuarial, que “acham” que ela é apenas uma suposição, um exercício aleatório e sem base científica de futurologia. No plano municipal, Itaúna tem um perfil conservador, no entanto tenho dito que a questão não é o conservadorismo, pois ser conservador não é um mal por si só. A questão é: o que queremos conservar? Na verdade, trata-se de um movimento retrógrado, saudoso dos anos de chumbo, dos anos da ditadura civil e militar que perdurou de 1964 a 1985. Esse conservadorismo ou esse movimento de marcha à ré não é só na política partidária. Acaba por se fazer presente nas mais variadas discussões dos mais variados temas. Penso que os últimos anos a intolerância tomou conta de parte significativa da cidade, do estado e do país. Quem pensa diferente torna-se inimigo e não adversário. Existem os que querem trocar a força do argumento pelo argumento da força. Alguns querem uma democracia a seu modo, uma transparência a seu modo. Exigem de outrem aquilo que negam a entregar. Preferem a vida de estilingue. Todos que pensam diferente devem ser levados à fogueira da Inquisição Medieval. Novamente lembro da ciência. Nesta era de pós-verdade defendem suas convicções sem buscar bases científicas, jurídicas, estatísticas e atuariais. Tudo indica, por outro lado, que o resultado das eleições presidenciais em Itaúna ainda terá um viés de direita. Não qualquer direita, mas a direita que não gosta de diálogo, a direita intolerante. Uma coisa é debater, por exemplo, com os “direitistas” João Amoêdo ou Henrique Meireles (Presidente do Banco Central no Governo Lula) e outra coisa é debater com outros expoentes de uma direita raivosa e intolerante, que infelizmente também espraia no espectro à esquerda.

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